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Judô feminino faz história no Rio, mas ex-atletas se revoltam com técnica

Rosicleia Campos, treinadora da seleção feminina de judô, foi alvo de críticas de ex-atletas - Divulgação/Fotocom
Rosicleia Campos, treinadora da seleção feminina de judô, foi alvo de críticas de ex-atletas Imagem: Divulgação/Fotocom

Rodrigo Farah e Rodrigo Paradella

Do UOL, no Rio de Janeiro

02/09/2013 09h22

A seleção feminina de judô cumpriu todas as expectativas e terminou o Campeonato Mundial com o melhor resultado da sua história: uma medalha de ouro, três de prata e duas de bronze. Mas um assunto polêmico rondou os bastidores do evento realizado no ginásio do Maracanãzinho na semana passada. Algumas ex-atletas da seleção não gostaram de declarações da técnica Rosicleia Campos e atacaram sua postura. 

O problema aconteceu após a treinadora ter afirmado que sentia vergonha da equipe feminina de 2005, que disputou o Mundial do Cairo, no Egito. O fato gerou revolta em parte das lutadoras que defendiam o time nacional, com direito a desabafos nas mídias sociais. 

“Vergonha sentia eu por ter uma técnica que só gritava, pulava e não vinha com as instruções ou estratégias que precisávamos nos momentos decisivos da luta”, comentou Vânia Ishii em discurso semelhante ao adotado por outras ex-atletas da seleção como Fabiane Hukuda e Tânia Ferreira. 

As declarações de Rosicleia foram feitas antes do Mundial-2013, no dia 22 de agosto deste ano, em entrevista ao portal Globo Esporte. "Quando elas lutaram o Mundial do Egito fiquei decepcionada. Sentei com elas no quarto e disse: 'Eu tenho vergonha dessa equipe'. Tinha uma equipe feminina que eu tinha vergonha. Falei: 'Não quero ter vergonha de ser técnica da equipe feminina, quero ter orgulho. Não quero ser técnica dessa equipe de jeito nenhum'", contou a técnica.

Em entrevista ao UOL Esporte, Vânia Ishii não poupou elogios à campanha da atual seleção brasileira. Apesar disso, a campeã dos Jogos Pan-Americanos de Winnipeg-99 reiterou sua insatisfação com Rosicleia e admitiu ter ficado bastante abalada com o ocorrido.

“Não poderia estar mais feliz e orgulhosa dessa campanha das meninas, mas é revoltante ter que ouvir o que ela [Rosicleia] falou. Foi uma falta de respeito, algo desagradável. Tivemos que superar muitos obstáculos, participávamos de seletivas e até taxas para lutar tínhamos que pagar. Depois de tudo, ainda ter que ouvir algo assim é decepcionante”, lamentou Vânia.

Primeira brasileira a se tornar campeã mundial júnior, Fabiane Hukuda disse que chegou a receber um pedido de desculpas de Rosicleia. A judoca acompanhou o Mundial ao vivo no Rio e também exaltou o trabalho do time brasileiro, mas ainda assim disse que ficou muito abatida com a situação.

“Não achei nada legal as declarações por tudo o que já fiz e estou fazendo pelo judô brasileiro. O que era vergonhoso naquela época era a falta de estrutura, falta de apoio e patrocínio. Nosso centro de treinamento era em Santa Cruz [subúrbio do Rio de Janeiro] e comíamos salsicha e asinha de frango. Dormíamos com 15 meninas em um quarto, Nós lavávamos os banheiros e os quimonos dos treinos na mão, tomávamos banho gelado... e ainda pagávamos por isso”, declarou Hukuda. 

Procurada pela reportagem, Rosicleia Campos evitou aumentar o atrito com suas ex-comandadas. A treinadora não pôde exercer a função à beira do tatame no Mundial por estar de licença-maternidade, mas acompanhou o desempenho das judocas do Brasil nas arquibancadas. 

“Nem quero comentar [declarações das ex-atletas da seleção]. As pessoas falam o que querem. O resultado está aí, não preciso provar nada para ninguém. Minha trajetória fala por si”, disse a técnica, que assumiu o cargo justamente em 2005.

O coordenador técnico da seleção, Ney Wilson, afirmou que ainda não teve tempo para analisar o ocorrido profundamente por conta das obrigações no Mundial. O dirigente, no entanto, também evitou maiores polêmicas e elogiou tanto o trabalho da treinadora como o passado das atletas na seleção. 

“A Rosicleia tem ética acima de qualquer coisa. Ela contribuiu muito para chegarmos até aqui, como também contribuíram todas as atletas que a criticaram. Alguém teve que asfaltar o caminho para o pessoal de hoje chegar, e essa geração [de 2005] fez isso. É uma geração de mérito”, comentou o coordenador.