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Bob Burnquist desafia lógica e usa paraquedismo e helicópteros para relaxar

Paulo Anshowinhas

Do UOL, em São Paulo

02/10/2013 06h00

Pessoas em geral costumam buscar lugares calmos e tranquilos para relaxar. Octacampeão mundial de skate e uma das mentes mais engenhosas da modalidade, o brasileiro Bob Burnquist foge completamente à regra. Para ele, a paz é alcançada em atividades pouco usuais para os “normais”, como um salto de paraquedas ou uma volta pilotando o próprio helicóptero.

“Quando você está no ar, a única coisa que você tem de fazer é se focar no que está fazendo para nada dar errado”, comenta ao se referir à forma como desliga das diversas atividades em que está envolvido para se dedicar a esta “terapia” radical.

Mais do que uma das maiores estrelas do skate mundial e vencedor do cobiçado Prêmio Laureus, o 'Oscar do esporte', Bob é um grande aficionado por esportes radicais.

“Eu surfo, piloto aviões, faço acrobacias aéreas, mas é no paraquedismo que me concentro mais”, conta ao explicar que “se você fica apenas andando de skate o tempo todo, chega uma hora que você não evolui mais”,.

O exemplo da radicalidade do brasileiro fora das pistas explica o sucesso nelas. Apesar dos inúmeros títulos conquistados, Bob sempre foi atrás de desafios maiores. Foi ele o mentor, junto com Danny Way, por exemplo, da primeira megarrampa, estrutura que pode medir impressionantes 30 metros de altura e mais de 110 de comprimento.

Nesta entrevista ao UOL Esporte, Bob Burnquist fala também sobre a sua vida em um rancho na Califórnia e sua atuação como empresário no ramo de alimentos, além das dificuldades em seguir em cima do skate até hoje.

UOL Esporte – Como você se sente na sua vida de “country boy”, vivendo em um rancho na Califórnia com sua rotina na cidade?

Bob Burnquist – É uma mistura bem legal. Eu achei esse rancho lá na Califórnia (em Vista, a cerca de 40 km ao norte de San Diego), justamente para montar as pistas. É uma área boa, bem localizada, consigo visitar todos os meus patrocinadores em menos de uma hora, dirigindo numa boa. Posso ir para a praia em 10 minutos, tenho todas as minhas pistas de skate lá. Hoje em dia, pilotando helicóptero, consigo aterrissar em casa, as vezes saio de lá mesmo... parece que o mundo dá uma diminuída. É muito legal (morar ali) eu tenho a liberdade para construir. Eu já tenho o half (pipe), o looping, o parafuso, a megarrampa, agora eu consegui um novo obstáculo para a megarrampa, sempre querendo fazer as coisas skatáveis, de repente até um bowl...

No seu rancho você produz alimentos orgânicos?

Eu já tive várias hortas orgânicas, elas vão de fase, a última que eu tive foi com a Chipotle (uma cadeia de restaurantes mexicanos), e fizemos um jardim orgânico por um ano, um ano e meio. Agora eu estou para refazer, inclusive já falei com a Break Up por se tratar de uma empresa de produtos alimentícios e ter tudo a ver, e talvez façamos esse projeto. Individualmente, eu tenho minhas plantinhas, mas em escala maior. As que eu tenho por lá eu tenho doado para as entidades locais, ThanksGiving, sem teto, e é algo bem legal.

Você é vegetariano?

Não. Eu apenas não como carne vermelha, nem carne de porco, por vontade mesmo. Mas eu como frango, peixe....

Você já teve uma fundação ou uma entidade do gênero?

Inicialmente, eu tinha uma fundação, mas eu tinha de fazer muita coisa, e levar muitas coisas nas costas, dai eu me associei à ASEC (Coalizão do Meio Ambiente dos Esportes Radicais, em tradução livre), para sustentabilidade, e fazemos muitas coisas através dessa entidade nos Estados Unidos. Aqui no Brasil, gostaria de começar esse trabalho mais em relação à construção de pistas, algo bem parecido com o que o (Tony) Hawk faz . Mais pistas, mais skatistas, o mercado cresce, mais skatistas novos aparecem, e é isso que eu estou pensando para um futuro próximo.

O que falta para começar esse projeto?

É preciso todo um estudo para começar uma OSCIP (Organização de Sociedade Civil de Interesse Público), mas é preciso calma para fazer direito. Tem muitos interessados, mas precisamos falar com a Prefeitura, e por eu ser uma referência tem muita gente procurando por novas pistas e devido à grande demanda em pouco tempo irá acontecer.

Percebemos que nas competições da Megarrampa você leva uns tombos fantásticos. O que te motiva a continuar, nenhum deles te levou a parar?

Quando você leva um tombo, você começa a refletir um pouco. Mas a dor faz parte. Eu venho sentindo dor desde moleque. Não tem nada de diferente. Mas obviamente que a pressão aumenta, o risco aumenta, e a dor aumenta. Nesse último tombo que eu tomei, que eu caí de cara mesmo... Eu nunca tinha quebrado o nariz andando de skate, mas dessa vez eu quebrei em quatro partes, cheguei a quebrar até a face, e eu tinha o septo desviado desde moleque. Então a melhor coisa que poderia ter acontecido foi eu ter quebrado a cara, porque dai eu fui lá e consertei (o nariz). Agora eu consigo respirar direitinho, mas foi dolorido. Foi bom, mas foi chato (risos).

O que significa superação para você?

Todo mundo tem um limite, algo que eu chamo de linha relativamente cinza, porque esse limite nós estamos sempre evoluindo e sempre crescendo. Por isso eu acho que a superação vem justamente depois de uma situação que te amedronta, um tombo, por exemplo, e passar por cima disso, psicologicamente, emocionalmente e continuar com a vida que você tinha antes sem se abalar. Mas se todos os dias você ficar ultrapassando limites, acho que também não é legal. Tudo tem um equilíbrio. Uma evolução e uma reflexão.

Sabemos que você pratica várias outras modalidades, algumas de alto risco como o wingsuit por exemplo. Você pode nomear algumas?

Paraquedismo é uma das modalidades mais divertidas e que mais me relaxam, e me sinto zen. As pessoas falam 'Você tá maluco, você não fica estressado?'. Não, porque depois de um certo tempo, tudo o que você faz constantemente você conquista um certo conforto. O paraquedismo para mim é uma atividade em que eu tenho de me focar naquele momento, porque também se eu pensar em outra coisa naquele momento eu morri. E é essa vida intensa, nesse momento, que me faz saltar, voar, fazer wingsuit, voar de helicóptero, avião, acrobacia, aí sim voltar para o skate que continua “fresco”. Porque se você fica só andando de skate, chega uma hora que cansa. Fora que você não aguenta. Skate no nível que a gente anda hoje, o corpo não aguenta. Quando eu não estou andando, eu tenho de fazer alguma coisa.

Essa nova geração de skatistas como Mitt Brusco tem uma outra flexibilidade que a sua geração não teve?

Acho que toda geração dá um passo. Quando eu comecei a andar, não existia a megarrampa, mas existia o 540 (graus), e a geração anterior não conhecia o 540. Dai vem a próxima geração e vê que é possível e começam desse patamar. Então essa geração de Mitt Brusco, Tom Schaar e outros, começaram com a megarrampa sendo possível, e o próprio Tom Schaar assistia à megarrampa em casa, sonhando que queria andar nela um dia. Hoje em dia, ele compete e não faz muito tempo que ele apenas assistia. Ele evoluiu muito rápido. Lógico, isso são fenômenos, nem todos tem essa evolução precoce assim, mas hoje em dia vemos muita aceitação dos pais, que aceitam a criança começar mais cedo e dão apoio.

Até quando você vai continuar andando? Qual o limite do seu corpo?

Olha, a gente tem a fragilidade real do corpo, mas eu não me vejo nem próximo de parar de andar de skate. Parar mesmo nunca. Você nunca para de andar de skate, mas é preciso ver em que nível e que performance. Competindo, eu já ganhei tantas competições que eu participei, já conquistei tantos prêmios, que hoje em dia eu penso mais em filmagens, que não são menos performáticas, às vezes chegam a ser até mais. Demanda bastante esforço às vezes para mim. Mas isso é mais interessante porque é mais interativo, me satisfaz.  São coisas diferentes, novas que não ficam batendo na mesma tecla. Competitivamente não devo ficar muito (tempo), mas em cima da performance eu pretendo continuar andando bastante.

Sua mensagem para finalizar.

Andar de skate, diversão total, evolução com os amigos. O mais importante é a gente curtir aquele momento. Muitas vezes a gente pensa, 'eu vou ser feliz quando for campeão mundial'. O momento que você está vivendo e a interação com os amigos, principalmente agora que eu vejo tudo o que passou, eu vejo a importância de aproveita