Medina terá que destruir escrita por título. E seu precursor confia nisso
Nos primeiros 31 anos do circuito mundial da ASP uma coisa era praticamente certa: o surfista a levantar o caneco no final da temporada seria australiano ou norte-americano (incluindo havaianos). Diversas gerações entraram e saíram do tour, mas na última etapa do ano, os campeões erguiam suas bandeiras estreladas durante o banho de champanhe. Ao todo foram 10 títulos para os aussies e 20 para os americanos.
Em 2014, Gabriel Medina pode quebrar essa lógica quase infalível. Mas, mesmo que consiga, não será o primeiro.
1989. Depois dos mitos Tom Carrol (AUS) e Tom Curren (EUA) conquistarem dois títulos seguidos cada, e Damien Hardman e Barton Linch ampliarem a vantagem australiana, foi a vez de um inglês roubar a cena.
Martin Potter, criado em Durban, na África do Sul, tem espaço cativo na galeria dos surfistas mais importantes da história do surfe competitivo. Considerado extremamente moderno para seu tempo, valorizava a potência e o risco nas manobras, ajudando a ASP a reconsiderar alguns critérios de julgamento para as baterias. Pottz, como é conhecido, foi também um dos precursores das manobras aéreas.
"Pottz ajudou a redefinir o surfe, na onda e acima dela. Power e ousadia, é isso o que interessa. O resto é firula", descreve Edinho Leite, ex-surfista profissional e mais respeitado comentarista de surfe do Brasil.
Hoje comentarista das transmissões via web da ASP, Potter acompanha com carinho a carreira do jovem que evoluiu ao extremo seu modo radical de surfar.
"Gabriel é um surfista incrível. Eu assisti ele quando ele era um garotinho em King of The Groms (competição da base do surfe). Desde cedo eu sabia que ele entraria na disputa por um título mundial. Mas esse ano ele é um surfista diferente, ele está mais inteligente, ele está ficando grande e forte, então a potência do seu surfe está ficando melhor também. Outra coisa que eu gosto no Gabriel é que ele é um cara muito inteligente dentro da água. O jeito como ele levas as baterias, o jeito como ele encontra as notas quando ele precisa delas. Ele está começando colocar mais pressão nas ondas grandes, ele está se tornando um surfista completo, algo que você precisa ser para vencer um título mundial. Você não pode ter apenas o jogo de aéreos, ou só manobras de borda, você tem que ter o pacote inteiro. E Gabriel está conseguindo isto neste ano.”.
Para comprovar sua tese, Pottz relembra a primeira etapa vencida por Gabriel nesta temporada, na Gold Coast australiana: “Em Snapper Rocks, ele não fez nenhum aéreo na etapa inteira. Ele estava confiando no seu surfe de backside, que é um pouco do que ele terá que fazer aqui em Backdoor: Grandes curvas, grandes batidas."
Segundo Martin, que tem informações privilegiadas sobre as intenções da ASP para a etapa, a competição deve recomeçar na quinta-feira, em condições diferentes do que estamos acostumados a ver em um Pipe Masters.
"As condições vão estar complicadas, o Havaí muda muito rápido. Então o que estamos esperando agora são ondas de 6 pés ou talvez um pouco maiores. Veremos um surfe de alta performance, que aliás pode ajudar o Gabriel. Ele provou no Tahiti que pode encarar o tubos grandes, o que é demais. Mas Backdoor é uma onda muito complicada de backside. Com um sweel vindo do norte, parece que Backdoor será o principal pico para a competição. Então Gabriel terá que fazer alguns grandes aéreos de backside e misturar um pouco. Quem apresentar um surfe mais performático vai ganhar”.
Medina está com a mão na taça, mas Pottz acredita que os desafios para o brasileiro estão para além das ondas.
"Vai ter muita pressão em cima dele. Quando eu o vi em Portugual, eu disse pra ele: venha para o Havaí só você e o Charles, volte para o básico, tente esquecer de toda a mídia. Tudo o que ele precisa fazer é vencer mais uma bateria e Kelly está fora da corrida pelo título. Ganhar mais duas baterias e Mick está fora da corrida pelo título. Então foque apenas nisso. Porque para um garoto tão jovem há muita pressão, todo mundo quer um pedaço dele, mas ele precisa se acostumar com isso, porque é isso que acontece quando você é o número 1 do mundo. É parte do jogo, você tem que conseguir achar tempo para cumprir as suas obrigações, cuidar dos seus fãs, mas também garantir que você tenha um tempo pra você mesmo. Isto é um verdadeiro malabarismo, mas você tem que achar esse equilíbrio”, analisa o britânico.
Se encontrar esse equilíbrio, Gabriel Medina pode se juntar a Martin Potter na até então solitária galeria dos destruidores da hegemonia do surf. Mas para Pottz, que venceu o circuito apenas em 89, o brasileiro vai ainda mais longe:
“Ele está um surfista muito mais completo, muito mais inteligente...eu dou mais dois anos para Gabriel se tornar imbatível."
*Nota: todos os dados citados na matéria levam em consideração apenas o circuito mundial da ASP, estabelecido a partir de 1983. Em outros formatos, o peruano Felipe Pomar (1965) e o sul-africano Shaun Tomson (1977) carregam a alcunha de campeões mundiais de surfe.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.