Aos 80 anos, Ney Matogrosso vai retomar turnê e diz não ter medo de morrer
Aos 80 anos, Ney Matogrosso está pronto para botar novamente o bloco na rua. O cantor, que faz aniversário hoje (1) demonstra animação para o retorno da turnê batizada em homenagem à música de Sérgio Sampaio e interrompida por causa da pandemia de covid-19. Dos shows adiados, algumas datas já estão remarcadas para outubro e novembro.
No dia em que completa oito décadas de vida, Ney só queria mesmo estar na estrada passando seu aniversário como quase todos os outros: trabalhando. Como ainda não é possível, fez um disco novo para se auto presentear.
Achei um jeito de não pirar, que foi gravar um disco. Há muitos anos eu não fazia um disco de estúdio. Minha maneira de trabalhar era primeiro ensaiar o show, fazer o show, e depois gravar. Dessa vez entrei no estúdio sem nem saber cantar direito as músicas. Ney Matogrosso
Ficar longe dos palcos por mais de um ano é algo inédito nos quase 50 anos de carreira do artista, os primeiros deles junto com o grupo Secos & Molhados. "Nu Com a Minha Música" foi pensado e gravado durante o período de isolamento por causa da pandemia. Quatro faixas chegam hoje, no formato de EP, e o álbum completo sai em novembro.
"Ontem fiz a última música. 'Tá pronta", revela Ney em um papo com Splash na antevéspera do seu aniversário.
Não fosse a pandemia, ele admite que o álbum nem existiria. O EP traz as versões do cantor para as faixas "Nu Com a Minha Música" (Caetano Veloso), "Mi Unicornio Azul" (Silvio Rodríguez e Pablo Milanés), "Se Não For Amor, Eu Cegue" (Lenine e Lula Queiroga) e "Gita" (Raul Seixas).
Firme e forte
Ney Matogrosso não teme o fim, mas também não tem planos de parar.
Quando eu era criança pensava que nos anos 2000 ninguém ia estar vivo. Mas estamos aqui em 2021, firme e fortes. Eu não tenho medo de morrer, não tenho medo do fim.
No presente, Ney impressiona com o mesmo físico há décadas e a vitalidade com que conduz suas apresentações. Questionado se concorda que é um sex symbol de 80 anos, ele ri, timidamente. "Isso não é comigo, isso é com aquele lá do palco. Não sou eu. Não acho que aquilo caiba na minha pessoa, cabe no personagem."
Personagem que enlouquece os seguidores da única rede social que ele mantém, o Instagram. "Lindo" é a palavra que mais se repete nos comentários. Ney retribui distribuindo beijos virtuais. É o próprio cantor que controla o conteúdo. "É uma maneira de corresponder o carinho que eu percebo ali", explica.
Apesar de ativo na conta e seguido por mais de 800 mil pessoas, o artista não tem apego aos likes ou números. "Eu sou uma pessoa que a partir de um momento da vida me senti muito seguro do que sou, de quem sou. Não preciso desses afagos. Acho até engraçado. Mas percebo que tem uma coisa carinhosa, é gostoso de receber."
'Todos podem ser o que quiserem'
Símbolo da liberdade com suas maquiagens e figurinos ousados que leva para os palcos desde os tempos da ditadura, Ney Matogrosso sabe que abriu muitas portas, mas prefere não vestir rótulos. A alma queer de seu trabalho surgiu de sua própria personalidade.
Eu não me considerava nada, não sabia nem que isso [queer] existia. Só vivia a minha vida conforme eu gostava. Não pensando nessa coisa de ter um comportamento. Sempre vivi muito solto, sem nem me preocupar com rótulos, nada.
A nova geração de artistas parece ter aprendido. "Eu provavelmente criei um espaço. Já que eu existia, elas também poderiam. E, na verdade, essa sempre foi a minha intenção. Todos podem ser o que quiserem", reitera.
Homenagens
Como parte das homenagens pelos seus 80 anos, Ney Matogrosso acaba de ganhar uma nova biografia publicada pela Companhia das Letras e assinada pelo jornalista Júlio Maria, mesmo biógrafo de Elis Regina. Um filme sobre a vida dele também já está na mesa da produtora Paris Filmes e o elenco em fase de testes.
E o que será que o cantor pensa de tantas homenagens?
Com biografia faço sempre corpo duro. Sempre fico com o pé atrás, mas biografia não pode impedir. Tem lei para isso. Você não pode fazer nada, sua vida é pública.
"O filme o pessoal da Paris me pediu que eu faça uma assessoria, que esteja junto com eles para não ter nenhuma informação errada e eu achei interessante. Não é para cortar nada, apenas para não ter uma informação errada."
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