O que explica o som especial do disco de vinil, queridinho de fãs de música
Resumo da notícia
- Criada em 1940, a tecnologia dos discos de vinil quase foi esquecida na década de 1990
- No entanto, o formato voltou à moda e atrai colecionadores
- O som característico do LP, mais arredondado, está diretamente ligado ao processo de gravação
- O vinil é gravado com sulcos que imitam as ondas sonoras e são transformados em sinais elétricos
Eles foram dados como mortos com a popularização dos CDs, nos anos 1990, mas acabaram ressurgindo das cinzas nos últimos anos. São os discos de vinil (ou LPs), atuais queridinhos tanto de quem sente saudades das nuances sonoras dos "bolachões" quanto de uma turma mais nova que acabou se apaixonando por esse tipo de mídia.
Um desses apaixonados é o analista de projetos Gilson Bispo. "Uma das coisas que eu mais gosto nos discos de vinil é que ele tem um som distinto em relação ao CD e outras mídias. Você consegue distinguir sons e instrumentos que acabam suprimidos em outros formatos. Sem contar que aquele som da agulha no início do disco é algo muito instigante", diz.
Para o professor Fernando Iazzetta, do Departamento de Música da Escola de Comunicações e Artes da USP, uma das justificativas para essa paixão por discos de vinil tem a ver com as características sonoras deste tipo de mídia, não com a sua qualidade em si.
"É uma questão de gosto, já que toda gravação é uma distorção do som real, seja na mídia que for. Na prática, existem dois motivos para as pessoas gostarem do vinil. Um é a nostalgia, o fato de ter crescido ouvindo música nessa mídia. Já em termos técnicos, é possível dizer que o som dos discos de vinil é mais arredondado, com menos transientes, que são uma espécie de ruídos rápidos que ajudam a definir a articulação do som", explica.
Em comparação com um CD, portanto, o som dos LPs é menos nítido, mas também é menos áspero. Não seria correto, portanto, dizer que a qualidade do vinil é melhor ou pior, mas sim que seu som é diferente. E outros componentes acabam afetando o resultado final.
"O áudio que a gente escuta passa por uma cadeia de dispositivos, como o leitor da mídia ou um conversor digital para analógico - no caso de mídias digitais -, o amplificador de som e a caixa acústica ou fone de ouvido. Cada um desses dispositivos tem uma sonoridade específica, então não é só a mídia que importa, mas também a qualidade desses outros elementos", diz Iazzetta.
Essa "assinatura sonora" dos discos de vinil é uma consequência direta da tecnologia usada nesse tipo de mídia.
Como funciona
Ela foi criada no final dos anos 1940 e o seu nome vem do tipo de plástico usado em sua construção, chamado vinil, que é feito de PVC. Esses discos são gravados por meio de uma prensa e um disco matriz, que "imprime" em sua superfície um sulco que percorre um caminho espiralado em direção ao centro. Os sulcos representam a vibração dos sons gravados.
Você tem uma onda sonora registrada no vinil que é análoga à onda sonora que se propaga no ambiente
Fernando Iazzetta, professor do departamento de Música da USP
Para serem "decodificados" em sons, esses sulcos são percorridos pela agulha do toca-discos que, ao vibrarem, produzem uma variação de tensão elétrica. Essas agulhas, em geral, têm uma estrutura de metal e uma ponta de diamante ou safira, minerais bem resistentes.
Ela fica apoiada em um sistema chamado cantilever, que por sua vez é ligado a um sistema composto por um ímã e uma bobina. Com o movimento da agulha, o ímã se move, fazendo com que o campo magnético dessa peça sofra interferências. Isso gera sinais elétricos que passam pela bobina e pela fiação do toca-discos.
O que os alto-falantes fazem, por sua vez, é o caminho inverso: transformar os sinais elétricos em movimento. Para isso, eles contam com uma bobina que, ao ser estimulada pelos sinais elétricos gerados no sistema da agulha, gera um campo magnético atraído e repelido pelo ímã do alto-falante. Este ímã, por sua vez, faz o diafragma do alto-falante vibrar, produzindo os sons.
Por unir etapas elétricas e mecânicas, diz-se que os discos de vinil utilizam uma codificação eletromecânica.
É um sistema consideravelmente diferente do visto em discos ópticos, como o CD, o DVD e o Bluray, que são lidos por leitores que emitem raios laser enquanto os discos giram.
Coleção revalorizada
"Eu comprei meu primeiro disco, uma trilha sonora de novela, em 1983. Na época eu tinha uns dez anos de idade e esses discos eram bem populares", conta o analista de projetos. "Um dos primeiros empregos que tive era o de cuidar do filho pequeno de uma vizinha, que tinha muitos discos. Aí pintou a paixão", explica. Quando comprou seus primeiros discos, Bispo precisava pegar emprestado vitrolas de conhecidos e vizinhos para poder ouvir.
A coleção de Bispo, que hoje conta com cerca de 16 mil discos, ficou um pouco de lado durante a segunda metade dos anos 1990, quando ele passou a comprar CDs. Um dos motivos para isso é que a produção de LPs no Brasil praticamente cessou nesta época: em 1997, apenas uma grande fábrica desse tipo de mídia ainda produzia esses discos no país.
Iazzetta explica que o vinil perdeu espaço porque conta de uma mudança de gosto dos consumidores. "Entre os anos 1980 e 1990, a indústria fonográfica estava em busca de qualidade sonora, a chamada alta fidelidade. Já a partir dos anos 1990, houve uma ruptura em relação a isso e as pessoas passaram a valorizar questões como portabilidade, rapidez e quantidade, deixando de lado a qualidade. É o caso dos áudios comprimidos em MP3".
Seja por questões nostálgicas ou não, o ressurgimento do vinil acaba sendo um movimento oposto ao citado pelo professor. É quase que uma resposta filosófica à praticidade oferecida pelos meios digitais, a busca por algo mais palpável.
O valor gasto, como é de se imaginar, é alto, "algo em torno dos R$ 80 mil". A coleção, porém, se valorizou com o tempo e hoje vale "mais ou menos três vezes mais" do que o que foi investido, estima.
Caso você decida colecionar discos de vinil, seja por motivos saudosistas ou filosóficos, é bom estar disposto a gastar dinheiro e ser cuidadoso com o que comprar.
"É um hobby caro, já que um disco novo custa em torno de R$ 100. Além disso, tem a questão do dólar e da taxação, caso você resolva importar. Os sebos são ótimas opções e eu tinha o hábito de sempre procurar por eles quando ia viajar. Já aconteceu de eu ter que comprar uma mala extra só para trazer os discos que eu tinha comprado", diz Bispo.
O colecionador também cita outro fator que merece a atenção dos interessados: a qualidade dos toca-discos, algo fundamental para aproveitar as nuances sonoras dos LPs. "Eu tenho diversos aparelhos, mas os atuais e mais baratos têm baixa qualidade. Os que uso para ouvir são os mais antigos".
Toca-discos considerados de alta qualidade, como os modelos da Audio Technica, têm preços acima dos R$ 1.000. É importante salientar que uma vitrola de baixa qualidade pode até mesmo estragar os discos de vinil.
Por fim, é preciso ter cuidado na hora de guardar os discos. Bispo dá a dica: "Eles devem ficar na vertical e longe de fontes de calor ou da incidência do sol, para não correrem o risco de empenar. Para limpar, eu uso uma mistura feita com 60% de álcool e o restante de água".
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