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OPINIÃO

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Dia Nacional da Adoção: desromantizar processo ajuda crianças e famílias

Regina Casé, Astrid Fontenelle, Gloria Maria e Giovanna Ewbank estão entre as famosas que adotaram filhos - Reprodução/ Instagram
Regina Casé, Astrid Fontenelle, Gloria Maria e Giovanna Ewbank estão entre as famosas que adotaram filhos Imagem: Reprodução/ Instagram
Rosane Chene

Colaboração para Universa

25/05/2022 04h00

Hoje, 25 de maio, é Dia Nacional da Adoção. O Brasil tem mais de 30.900 crianças acolhidas em abrigos, segundo dados do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA) do Conselho Nacional de Justiça (2020). É importante desromantizar um processo que luta contra 'mitos e fábulas' que tornam o processo ainda mais difícil para ambos os lados. Engana-se quem acredita que nos abrigos todas as crianças estão disponíveis para adoção. Aliás, diante de tantos mitos que envolvem a adoção, o mais cruel é acreditar que existem tantas crianças disponíveis para adoção quantas as famílias que esperam tê-las.

"Orfanato" é uma nomenclatura antiga, em desuso, e define um estabelecimento que recebe crianças e adolescentes em situação de abandono. E encontravam ali a moradia até encontrarem uma nova família. O termo atual é "abrigo", que oferece moradia provisória para crianças e adolescentes, com foco no retorno destas às famílias ou encaminhamento para famílias substitutas. Porém, mas importante que a nomenclatura que é define é o trabalho que ela presta na transformação social, oferecendo às suas crianças oportunidades de educação, formação profissional, esportes e artes.

De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), atualmente existem cerca de 4 mil crianças e adolescentes na fila da adoção no Brasil -?a maior parte delas têm mais de 15 anos de idade para uma fila que que supera os 35 mil inscritos para receber um novo integrante.

Mas, quais os fatores tornam o processo lento e burocrático para entregar esses 4 mil que crescem em abrigos às essas famílias que amargam uma espera sem fim nas filas de adoção?

Em primeiro lugar, é preciso acabar com o conceito romantizado da adoção. É preciso buscar as informações corretas para começar o processo. Visitar abrigos e encontrar a criança antes da fila de adoção atrasa demais todo o processo. Procurar o abrigo, escolher a criança não são as primeiras etapas. É preciso iniciar pela Vara de Infância e Juventude e estar ciente de que quanto mais "filtros" se coloca na busca, maior seu prazo na fila.

A diferença entre a intenção de adotar e escolher um filho para criar é bem grande e a fila, prioritariamente, se ocupa em buscar uma família para a criança a ser adotada e não o contrário: encontrar para a família uma criança com todos os filtros que eles desejam.

É isso que aumenta o tempo na fila. Porém, para quem não faz restrições e se dedica a dar um lar para uma criança que não seja preferencialmente branca, com até 3 anos de idade, sem qualquer problema de saúde etc. o tempo de espera na fila tende a ser menor. Na fila, tem crianças acima de 15 anos (as mais rejeitadas), HIV positivas, com deficiências inúmeras.

Até estar totalmente apta para adoção, a legislação exige algumas etapas que são importantes para a criança. É preciso que sejam reativadas as tentativas de convivência com a família biológica, com acompanhamento e segurança. Mesmo com casos de violência, maus tratos ou incapacidade para prover os direitos da criança, sabemos que muitas delas preferem viver com suas famílias originais a serem entregues à sorte da adoção. Mesmo com todos os problemas, a criança prefere permanecer com sua família biológica, pelo vínculo afetivo e por não conhecer outro modelo de família e afeto.

Quando se constata legalmente que a família biológica não pode mesmo ter a guarda, a criança ainda tem que passar por um período de adaptação com a nova família. Esse é um processo difícil e doloroso.

O tempo para as crianças é curto nesse processo. Quanto mais crescem, menos chances de serem escolhidas. Menos "filtros" carregam. Segundo dados divulgados pelo Conselho Nacional da Justiça em 2021, enquanto existiam na ocasião cerca de 1.700 processos de adoção de crianças até 3 anos, o país tinha apenas 103 processos para os mais de 15 anos.

Outro engano é achar que para adotar uma criança é preciso ter casa própria, patrimônio avaliado entre outros. Poucos sabem que para se adotar alguém é preciso ser maior de idade e ter a intenção real e comprovada de acolher um novo filho. Mais nada.

Mais um mito a ser derrubado é sobre o cancelamento da adoção. Isso não existe. Uma vez adotada, com o processo totalmente concluído com todas as etapas a adoção legalizada é irrevogável. Ninguém, por lei, tira da família adotiva essa criança. Isso é um mito maldoso que faz as famílias recuarem e desistirem da adoção. No site do CNJ é possível encontrar o passo a passo da adoção.

Ante ao processo de adoção, as instituições que abrigam essas crianças exercem um trabalho legítimo de transformação social. Recebê-las nas condições emocionais e físicas que chegam implica em dar a elas o amor que lhes foi negado ou tirado. Essas instituições se encarregam de reconstruir essas crianças e prepará-las para um mundo diferente, com a rotina de estudo, alimentação, diversão que é exigido por lei para que tenham um desenvolvimento completo. Para que sejam e vivam como crianças na sua essência.

É trabalhar todos os dias para que apaguem de suas vidas a rejeição, a memória de outros tempos e tudo isso em meio a visitas e adaptações que precisam enfrentar em novos lares e famílias interessadas em adotá-las.

A verdade é que não há romantismo na adoção. A adoção é um sofrimento! Para quem está na fila à espera e para quem faz a fila andar. Dar este passo, implica em se livrar do preconceito, colocar o amor em dobro acima da causa pessoal e entender cada fase desse processo. É estar ciente todos os dias que ser adotado é uma sorte, mas também é uma tristeza.

Afinal, para ganhar uma nova família é preciso perder de vez a família biológica. Isso não é ganho. É um empate, na melhor das hipóteses.

* Rosane Chene é fundadora e diretora da ONG Projetos Amigos das Crianças, Rosane Chene é responsável pela administração e gerenciamento da entidade, que hoje conta com mais de 92 colaboradores e mantém cinco programas sociais que alcançam mais de 5.500 pessoas em situação de extrema vulnerabilidade social na periferia de São Paulo.