Como um homem chamado de Zé das Camisinhas fez 6/9 virar o Dia do Sexo?
Você já parou para pensar que o Dia das Mães, o Dia dos Pais, o Dia do Obstetra e tantas outras comemorações só existem por causa do sexo? Afinal, ele dá origem a todas as pessoas celebradas. Nada mais justo, então, ter um dia dedicado ao sexo também.
Foi com esse raciocínio que nasceu a campanha publicitária em prol do Dia do Sexo, lançada pela Olla em 2008. A data escolhida só podia ter a ver com transa: dia 6 de setembro (6 do 9), uma alusão à posição sexual conhecida como 69.
A origem
Naquele ano, a marca de preservativos pertencia a José Araujo, 68, que tinha uma fábrica de camisinhas desde 1979, a INAL (hoje, INALTEX). Carlos Domingos, 55, era dono da agência de publicidade Age, que atendia a Olla.
Quando a equipe criativa se deparou com a feliz coincidência no calendário, desenvolveu a campanha, veiculada em vídeos, anúncios, peças de internet, email marketing e site próprio. Você lembra?
Além da pretensão comercial, a jogada de marketing tinha outros objetivos. Um era oficializar o Dia do Sexo no Brasil.
Um manifesto no site convocava as pessoas a preencherem um abaixo-assinado que seria levado à Câmara dos Deputados, mas o processo não foi para frente. Mesmo assim, a data entrou para o calendário popular.
Hoje, outras marcas de preservativos, restaurantes, motéis, floriculturas e negócios de outros ramos aproveitam a data para se promover. O dia também é gancho para discutir sexualidade, orgasmo feminino, saúde e prazer em diversos espaços.
"Não imaginava que ia atingir toda essa dimensão, mas eu fico muito gratificado", disse José ao UOL. "Foi um trabalho que eles fizeram e, graças a Deus, até hoje, está crescendo mais ainda."
Outro foco era tornar o sexo uma discussão natural. "A gente imaginou fazer uma data que realmente pudesse levar as pessoas a refletir, comentar, trazer o assunto para a luz, porque na época tinha muito essa questão do sexo no escuro, uma coisa errada, escondida", disse Domingos, hoje CEO da agência OD Brasil.
No mesmo embalo, o propósito também era conscientizar os brasileiros sobre sexo seguro e prevenção de IST (infecções sexualmente transmissíveis).
"As pessoas se assustaram muito com a aids, o uso do preservativo foi lá em cima. Depois com os tratamentos, as pessoas começaram a largar a mão", comenta Denis Araujo, 43, sócio-diretor da INALTEX e filho de José.
Domingos lembra que a reação à campanha foi grande e rápida. "As pessoas acharam muito divertido, criaram comunidades no Orkut, a adesão foi imediata. Infelizmente não era como hoje, com as redes sociais tão presentes. Provavelmente viraria um negócio muito maior."
O Zé das Camisinhas
Em 1969 — atenção aos números sugestivos —, José tinha uma empresa junto com os pais que comercializava preservativos. O produto vinha de uma fábrica em São Roque (SP), que também vendia para outras companhias colocarem suas marcas próprias.
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Quero receberMais tarde, uma dessas companhias comprou a divisão de camisinhas da indústria, e a família ficou sem ter de onde comprar o item. Então, em 1979, fundaram a INAL, sendo proprietária das marcas de preservativo Olla, Lovetex e Microtex.
Por 30 anos, José liderou a empresa como diretor comercial e ficou conhecido no mercado como Zé das Camisinhas, um ícone para o setor. Tanto que, em 2009, quando ele decidiu vender a fábrica, houve apelos para que continuasse no ramo.
A indústria foi vendida para a Hypermarcas, sendo que a planta da empresa se manteve alugada pela família enquanto José seguia como consultor. Em 2017, a Hypermarcas vendeu a divisão de preservativos para a Reckitt Benckiser, que também adquiriu as marcas Olla e Jontex.
Naquele momento, Zé resolveu se afastar do mercado. Dois anos depois, a Reckitt fechou a planta de produção e demitiu 300 funcionários. Como o imóvel onde a fábrica funcionava ainda era da família Araujo, ficaram na dúvida sobre o que fazer com ele.
Em paralelo, o empresário começou a receber pedidos para retornar ao mercado. "Aí veio a parte sentimental", diz. Junto com o filho Denis, se relançaram como INALTEX. "Não foi muito com a razão, foi mais com a emoção."
Nesse retorno, reencontraram Carlos Domingos, cuja agência atual segue atendendo as marcas da indústria: Prosex e Oba.
Na terceira geração da família, a empresa tem capacidade produtiva de 12 milhões de preservativos por mês e quer aumentar para 30 milhões por meio de terceirização e exportação. Também aposta em um preservativo antialérgico feito de látex sintético, ainda em processo de registro.
Novo mercado
Após 16 anos da campanha, Domingos destaca um movimento positivo. "A gente fica muito feliz de ver que o sexo saiu do anonimato, aquela coisa errada, pervertida, para uma coisa que é saudável, como você fazer exercício ou tomar sol."
Em outra via, José observa que os jovens perderam o medo e a preocupação com IST. "Não se tem aquele medo que o pessoal tinha, o cuidado que se tinha, tanto que o mercado do preservativo deu uma estagnada, não tem crescido."
Já em 2017 tínhamos o alerta: nove em cada dez jovens de 15 a 19 anos sabiam que usar camisinha era o melhor jeito de evitar infecção por HIV, mas seis em cada dez não tinham usado preservativo no ano anterior.
Segundo o Ministério da Saúde, 59% dos brasileiros acima de 18 anos que fizeram sexo nos 12 meses anteriores a uma pesquisa de 2019 não usaram camisinha nenhuma vez. A falta de proteção aumenta o risco de infecções.
Em 2023, 4 mil mulheres entre 15 e 24 anos foram infectadas pelo HIV em todo o mundo, semanalmente, conforme a Unaids. "Esse assunto é urgente, por isso essa data é tão importante, porque acho que o jovem está precisando voltar a se conscientizar e fazer sexo seguro", comenta Denis.
Com esse cenário, a INALTEX adota uma comunicação com foco no público jovem. Domingos exemplifica com a campanha da Prosex, que traz cores, stickers e humor.
"A gente conseguiu sair na frente dos concorrentes, que continuavam com as cores escuras, as propagandas que mostravam só a apegação. A gente percebeu que, hoje em dia, a nova jornada do sexo é no digital", afirma.
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