Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Trabalhar menos para viver melhor?
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Você não andou muito bem nos últimos dois anos e precisou de algum tipo de remédio para aliviar angústia e sofrimento? Se sim, você está longe de estar sozinho. A pandemia explica parte das questões de saúde mental, mas essa é uma onda que já vem crescendo desde o final do século 20.
Muitas empresas, antenadas como o adoecimento psíquico de parte da sua força de trabalho, têm investido em palestras, aplicativos e terapias online, além de eventuais consultas com psiquiatras. Isso é bom, mas pode não ser o suficiente!
Se a saúde mental realmente se tornou uma prioridade para as corporações seria importante refletir até que ponto as relações com o trabalho não estão na origem do problema. Assim, repensar as condições do emprego (como a carga horária, por exemplo), além das proteções e benefícios ao colaborador, poderiam ter um papel central na prevenção dos transtornos mentais.
Um artigo do jornal "The New York Times" da última semana trouxe uma pesquisa mundial do Instituto Ipsos que aponta que 30% dos trabalhadores considerariam um novo emprego caso a sua empresa voltasse à modalidade presencial. O trabalho remoto (ou parcialmente remoto) parece ter vindo para ficar.
Não só onde, mas quanto
Para boa parte dos trabalhadores um trabalho realmente flexível deveria investir não apenas onde as pessoas querem trabalhar, mas também em quando e quanto querem se dedicar às suas funções. A produtividade não dependeria unicamente de estar em um local determinado por oito horas consecutivas.
Para os especialistas, embora boa parte das ocupações sejam dependentes do tempo (professores que dão aulas ou médicos que fazem plantões), muitas outras podem ser mais flexíveis. Assim, trabalhadores poderiam ajustar escalas de acordo com sua rotina (e não ao contrário), o que traria benefícios para sua saúde e produtividade, com uma força de trabalho mais satisfeita e engajada.
Pais e mães, por exemplo, poderiam adequar seu horário de acordo com as demandas criadas pela educação dos filhos, o que poderia reduzir o eterno conflito entre carreira e cuidados parentais. Além disso, muita gente trabalha melhor logo cedo, enquanto outros preferem à tarde e à noite. Adequar trabalho ao nosso ritmo biológico pode melhorar a dedicação e a criatividade.
Outras formas de trabalhar
A pandemia mostrou que outros modos de trabalhar e produzir são possíveis, desde que as pessoas e equipes tenham tempo para se adaptar, e as empresas estejam abertas aos novos desafios. Jornadas de 4 dias na semana (ao invés de 5), 30 horas (ao invés de 40), períodos de maior dedicação intercalados com períodos mais tranquilos, entre outras possibilidades, são alguns dos caminhos já adotados por algumas empresas e governos. Terminar o trabalho em menos tempo pode indicar profissionalismo e não falta de dedicação.
Em uma entrevista publicada na última semana no jornal "El País", o psicólogo e antropólogo britânico James Davies, professor da Universidade de Roehampton e autor do livro "Sedated: How Modern Capitalism Created Our Mental Health" (Sedados: Como o Capitalismo Moderno Criou Nossa Saúde Mental), defende que uma redução na jornada de trabalho teria o potencial de melhorar a saúde mental da população.
Para Davies, a sociedade moderna medicalizou nossas emoções e busca apenas aliviar sintomas ao invés de investir em mudanças sociais que poderiam prevenir sofrimentos e transtornos mentais, como empregos e salários melhores e mais tempo livre. Segundo ele, 25% da população no Reino Unido recebeu alguma prescrição psiquiátrica em 2021, o que indica que nossa sociedade está em uma encruzilhada.
Sociedade do cansaço
A obsessão do sistema em criar pessoas mais produtivas e consumidoras, em detrimento da felicidade e do bem-estar, tema muito bem explorado pelo filósofo sul-coreano Byung-Chul Han em seu livro "Sociedade do Cansaço", pode estar na raiz do crescente número de pessoas com problemas de saúde mental, entre elas depressão, ansiedade e burnout.
E para quem quiser ler um pouco mais sobre os aspectos positivos das novas modalidades de trabalho, vale uma espiada nos livros de Alex Soojung-Kim Pang, sociólogo e professor da Universidade de Stanford: "Shorter: Work Better, Smarter and Less" (Mais curto: Trabalhe Melhor, Mais esperto e Menos)
e "Rest: Why You Get More Done When You Work Less" (Por que você consegue fazer mais quando trabalha menos).
Se você acha que anda muito esgotado ou não tem se sentido muito bem nos últimos meses, que tal pensar como anda sua jornada e as relações com seu trabalho? Sua saúde e família agradecem!
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