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Mariana Varella

REPORTAGEM

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HPV: Ministério da Saúde amplia faixa etária de vacinação para meninos

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Imagem: iStock

Colunista de VivaBem

14/09/2022 04h00

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O Ministério da Saúde ampliou a faixa etária de quem pode receber a vacina contra o HPV e passou a incluir os meninos de 9 e 10 anos de idade no público-alvo. Anteriormente, só podiam se vacinar pelo SUS (Sistema Único de Saúde) meninos de 11 a 14 anos, meninas de 9 a 14 anos e homens e mulheres de 9 a 45 anos imunossuprimidos* (que vivem com HIV/aids, estão em tratamento oncológico, realizaram transplante de órgãos etc.).

A partir deste mês, a idade de meninas e meninos aptos a receberem as duas doses recomendadas da vacina passa a ser a mesma, definitivamente.

A inclusão visa ampliar a cobertura vacinal entre os meninos, já que muita gente desconhece que o sexo masculino precisa se vacinar contra o vírus, e facilita a comunicação de campanhas.

Como a maioria dos casos de câncer de colo de útero, o terceiro mais frequente entre as mulheres, é provocada pelo HPV, é natural que as mulheres conheçam mais a vacina.

O câncer de colo de útero matou mais de 6 mil brasileiras em 2019, de acordo com o Atlas de Mortalidade por Câncer, disponibilizado pelo SIM (Sistema de Informações sobre Mortalidade). É muito triste pensar que essa é uma doença que, na maioria dos casos, é evitável com exame de rastreamento e uma vacina ofertada gratuitamente.

Apesar disso, a cobertura vacinal do imunizante contra o HPV está bem abaixo dos 80% recomendados pelo Ministério da Saúde. Entre as meninas, apenas 55% do público-alvo recebeu o esquema vacinal completo em 2019. Entre os meninos, esse número é ainda mais baixo: somente 36,4% tomaram as duas doses, de acordo com a pasta.

Mas por que os meninos devem se vacinar contra o vírus?

Em primeiro lugar, homens podem passar o vírus para as parceiras e parceiros. Além disso, o HPV pode causar doenças em homens também, como câncer de pênis, de ânus, de uretra e de garganta, além de provocar condiloma (o Ministério da Saúde afirma que cerca de 10% da população terá verrugas genitais em algum momento da vida). Assim, a vacina permite uma vida sexual mais saudável e com mais liberdade, visto que o preservativo, apesar de diminuir o risco de transmissão, não evita totalmente o contágio, pois não impede o contato entre as mucosas que podem conter o vírus.

Muitos pais acreditam que vacinar crianças contra uma infecção sexualmente transmissível fará com que elas iniciem a vida sexual mais cedo. Além de não haver nenhuma relação entre a vacina e o início precoce da vida sexual, o motivo para vacinar as crianças é puramente biológico: elas costumam ter uma resposta imunológica mais efetiva às vacinas do que adultos, principalmente antes de entrarem em contato com o vírus.

Países que organizaram boas campanhas de vacinação contra o vírus viram o número de casos de câncer do colo de útero despencar. O exemplo mais bem-sucedido é o da Austrália, que prevê erradicar a doença até 2028. Ruanda, no continente africano, conseguiu vacinar 94% das meninas e também espera reduzir drasticamente a taxa de mortalidade por esse câncer, em geral mais comum em países pobres.

Desinformação

Poucas vacinas foram alvo de desinformação como a vacina contra o HPV. Entre 2014 e 2017, a equipe médica do IPq (Instituto de Psiquiatria) da USP avaliou, a pedido do Ministério da Saúde, mais de uma dezena de jovens acreanos que relataram sintomas como convulsões e desmaios que estariam associados à vacina contra o HPV.

Os psiquiatras Renato Luiz Marchetti e José Gallucci Neto analisaram os 16 casos mais graves de um total de 74 no Hospital das Clínicas da USP, e concluíram que a maioria havia desenvolvido um quadro de doença psicogênica, cujos sintomas têm origem psíquica e não orgânica.

"Trata-se de uma doença funcional do sistema nervoso, associada a uma situação de estresse emocional, no caso a vacinação. O paciente não inventa a doença, ele sofre de fato, mas os sintomas, embora estejam relacionados ao evento da vacinação, não são de forma nenhuma causados pelo imunizante", explicou Gallucci.

Mesmo que os sintomas não tenham sido gerados pela vacina, o caso dos meninos do Acre ganhou a mídia, causando pânico nos pais. Outros surtos de doença psicogênica foram relatados no Brasil e no exterior, e isso incitou uma série de desinformações a respeito da vacina contra o HPV.

Além disso, o movimento antivacinista, bastante ativo na Europa e nos Estados Unidos, mas incipiente no Brasil, país cujo PNI (Programa Nacional de Imunizações) é reconhecidamente bem-sucedido, ganhou força durante a pandemia de covid-19. Um de seus alvos preferenciais é exatamente a vacina contra o HPV.

Pesquisa da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações) e da Avaaz, realizada em 2019 com 2 mil pessoas acima de 16 anos, avaliou o impacto das fake news na vacinação. A pesquisa revelou que 7 em cada 10 pessoas acreditam em, no mínimo, uma informação imprecisa sobre vacinas.

Esse dado revela a importância de os profissionais de saúde abordarem o assunto todas as vezes que tiverem oportunidade, mesmo em atendimentos a outras questões de saúde. Além disso, é necessário ampliar a comunicação das campanhas de vacinação, como forma de levar informações confiáveis à população e estimular sua adesão.

*Para homens e mulheres de 9 a 45 anos imunossuprimidos*, a vacina é oferecida em 3 doses, com intervalo de 2 meses e 6 meses.