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O surto europeu de varíola do macaco e a suspeita de sua transmissão sexual
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A infectologia definitivamente não é uma especialidade médica monótona. No momento em que muitas pessoas começavam a pensar que a pandemia de covid-19 estava se encaminhando para deixar de ser uma emergência de saúde mundial, o surto na Europa de uma doença rara deixa o mundo novamente em estado de alerta.
Trata-se da Varíola do Macaco, uma doença infecciosa causada pelo Monkeypox virus, classificado cientificamente na mesma família que o vírus causador da varíola, que por sua vez foi considerada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) desde o ano de 1980 como enfermidade erradicada por meio da vacinação.
A varíola do macaco não é uma doença nova. Identificada pela primeira vez na década de 1950, teve desde então a maior parte dos casos em humanos registrados na África ou em pessoas que estiveram nesse continente. Fora da África, havia até então o relato de apenas um surto relevante ocorrido nos Estados Unidos no ano de 2003.
Desde o início desse mês, no entanto, a Europa está vivendo em tempo real o roteiro de um desses filmes de epidemia.
No dia 7 de maio, foi identificado no Reino Unido o primeiro caso da doença em um homem proveniente da Nigéria. No dia 14, foram identificados 2 outros casos que não tinham antecedente de viagem nem qualquer relação com o primeiro paciente. Já em 16 de maio foram confirmadas mais 4 pessoas com a doença, sendo uma delas o primeiro caso fora de Londres. E, por fim, no dia 18 foram diagnosticados mais dois casos, somando um total de 9 casos em 11 dias de surto.
Nesse meio tempo, enquanto as autoridades britânicas ainda procuram estabelecer algum tipo de nexo epidemiológico entre os casos encontrados, nos dias subsequentes foram confirmados mais 14 casos da doença em Portugal, além de um caso nos Estados Unidos, e diversos outros casos suspeitos em investigação na Espanha, Itália, Suécia, França e Canadá.
Segundo a OMS, os sintomas da varíola do macaco costumam se iniciar com febre, cansaço, aumento dos gânglios, dores musculares e de cabeça, com posterior surgimento de lesões de pele que evoluem desde bolhas até úlceras. Os sintomas em geral se iniciam de 6 a 13 dias depois do contato com o vírus e, na grande maioria das vezes, a doença é leve e autolimitada, se resolvendo completamente dentro de 14 a 21 dias.
No surto atual, não há relato até o momento de nenhum óbito em decorrência da doença.
No Brasil não temos nenhum caso confirmado ou em investigação de varíola do macaco, mas devido ao intenso fluxo migratório existente entre o país e a Europa, é mais do que recomendado que profissionais da saúde e população estejam atentos ao aparecimento de quadros clínicos compatíveis e sugestivos da doença.
Ainda em etapa inicial de investigação do surto atual, um dado que chamou a atenção dos epidemiologistas britânicos foi que todos os 4 casos confirmados no dia 16 de maio ocorreram em homens que se identificavam como gays ou bissexuais, o que levantou a suspeita sobre uma eventual transmissão sexual do vírus.
Apesar de nunca ter sido classificado como uma IST (Infecção Sexualmente Transmissível), o Monkeypox virus tem sua transmissão entre humanos considerada como pouco eficaz e por meio de contato próximo com uma pessoa doente, o que em geral costuma acontecer durante uma relação sexual.
Na última semana, a autoridade de saúde britânica publicou um alerta oficial direcionado para homens gays e bissexuais com o objetivo de redobrar a atenção desse grupo para os sintomas da doença. Entretanto acredito que é preciso ter muito cuidado com movimentos desse tipo.
Trata-se de um surto em início de investigação, portanto, dado o ainda pequeno número de casos confirmados, penso que é muito cedo para se chegar a conclusões sobre um padrão de transmissão viral na população.
Além disso, a história da pandemia do HIV já nos ensinou que até mesmo as abordagens bem-intencionadas direcionadas para subgrupos populacionais específicos foram as responsáveis pelo surgimento de uma estigmatização que já perdura por mais de 4 décadas.
Uma vez que o Monkeypox virus não é capaz de se espalhar rapidamente entre humanos, os epidemiologistas europeus não acreditam que este é o início de uma pandemia, mas sim de um surto que logo estará controlado.
A vacinação contra a varíola aparentemente induz uma proteção considerável contra o Monkeypox virus, no entanto não se encontra disponível e nem está sendo recomendada para a população dos países com casos confirmados da doença.
Se por um lado o noticiário está parecendo o roteiro parece de um filme de epidemia, por outro não há nenhum motivo para pânico. Agora é hora de preparar a pipoca, deixar os epidemiologistas trabalharem e ficar atento às orientações das autoridades de saúde pública local.
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