Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
'A Herança' mostra de forma linda que saúde dos homens gays vai além do HIV
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Histórias das décadas de 1980 e 1990 tratando da epidemia de HIV/Aids são como as da Segunda Guerra Mundial: todo mundo já conhece o roteiro e sabe mais ou menos o que vai acontecer. E mesmo assim, essas histórias continuam sendo contadas porque precisam continuar sendo contadas.
O início da epidemia de HIV/Aids infelizmente se aproxima do Holocausto por ambos serem fenômenos que atravessaram a humanidade transformando-a em definitivo e provocando um número inadmissivelmente grande de mortes que, não-aleatoriamente, se concentraram em grupos específicos da população mundial.
Continuar contando histórias dessas tragédias é uma forma de lembrar e homenagear as vidas daqueles que nelas partiram, de elaborar as marcas que esses acontecimentos deixaram na sociedade e, quem sabe, evitar que fenômenos semelhantes voltem a acontecer no futuro.
Consigo agora facilmente lembrar de uma longa lista de filmes, peças de teatro, livros, séries, musicais e documentários produzidos ao longo das 4 décadas de epidemia de HIV que cumpriram bem esse papel. Mas existem algumas dessas produções que se sobressaem por conseguirem impactar de um jeito especial.
Um bom exemplo é a peça "A Herança", que entrou em cartaz no início de março em São Paulo. Adaptação para o Brasil da premiada obra do norte-americano Matthew López, a peça é dividida em duas partes de cerca de 3 horas cada. E acredite, apesar de longo, o texto prende sua atenção do início ao fim.
"A Herança" até agora fez sucesso por onde passou e conseguiu se destacar entre as várias obras do gênero por diversos motivos, mas o que me chamou a atenção foram três pontos: o momento em que a trama acontece, o ritmo do texto e o enfoque escolhido para abordar a saúde dos personagens.
Diferentemente da maioria das montagens que tratam do HIV/Aids, a trama da peça se passa nos tempos atuais e não no início da epidemia. Isso não só deixa o tema mais próximo da vida do espectador, como permite que a obra tenha também uma função educativa, ensinando a plateia, por exemplo, que na moderna prevenção combinada do HIV a camisinha não está sozinha.
Os 12 atores que compõe o elenco se desdobram de maneira primorosa em diversos personagens na apresentação das 89 cenas da peça, não deixando em nenhum momento o interesse pela história cair. O fluxo intenso dos diálogos ajuda bastante nessa tarefa, deixando a peça jovem, atual, interessante e acessível até mesmo para aqueles que só iriam nascer muito depois do início da epidemia de HIV.
Com praticamente todos os personagens homens gays, a peça consegue deixar evidente de forma leve e sem julgamento que a saúde integral desse grupo não se encerra no HIV/Aids. Nos lembra entre piadas e risadas que, mesmo sem a tragédia causada por essa epidemia, temas como relacionamentos, família, envelhecimento, solidão, saúde mental ou abuso de álcool e outras substâncias são questões também presentes e importantes na vida dos gays, assim como no restante da população.
Como um retrato bonito da realidade, "A Herança" nos leva a refletir sobre os caminhos tomados por uma sociedade que há 42 anos teve sua trajetória transformada por um vírus. Caminhos esses muitas vezes de preconceito e discriminação.
Assim como as boas obras sobre a Segunda Guerra Mundial são recomendadas para a formação de uma opinião crítica sobre essa passagem da história, "A Herança" ficará consagrada entre as boas obras que devemos recomendar sobre HIV/Aids e da saúde da população gay.
Nos dois casos, se bem difundidas essas obras podem ajudar a humanidade a escolher no futuro caminhos melhores.
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