Com casos de sífilis em alta, Brasil precisa rever plano de controle
Com a chegada do final do ano, se inicia no Brasil a temporada de publicação dos boletins epidemiológicos de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs), trazendo as atualizações sobre a situação dessas epidemias no país.
Na última semana, foi a vez do Boletim Epidemiológico de Sífilis 2023, e as novidades anunciadas pelo Ministério da Saúde não são nada boas.
No Brasil, os casos de sífilis transmitidos por via sexual, classificados como casos de Sífilis Adquirida, passaram a fazer parte da lista de doenças de notificação compulsória apenas em 2010. De lá para cá, o que se viu foi o crescimento exponencial no registro de novos casos ano após ano. Na última década, a taxa anual de detecção de novos casos de sífilis aumentou em mais de 7 vezes.
Desde que os casos começaram a ser notificados, a tendência de crescimento explosivo só teve uma pequena trégua em 2020, no entanto acredita-se que isso tenha ocorrido devido à menor capacidade de diagnóstico e notificação durante o pico da pandemia de covid-19. E não por uma verdadeira redução na transmissão da IST.
Passada a covid-19, os casos voltaram a subir. Em 2022, o país bateu o seu recorde registrando 213.129 novos casos de sífilis adquirida, o que significa um aumento de quase 30% em comparação com o ano anterior.
Os casos de sífilis no Brasil se concentram entre homens das regiões Sul e Sudeste, notando-se na última década o crescimento mais expressivo entre indivíduos mais jovens. Entre os adolescentes de 13 a 19 anos, por exemplo, a taxa de incidência da IST praticamente triplicou nesse período.
Uma vez que a sífilis é uma IST bacteriana curável desde que diagnosticada e tratada, o fato de haver regiões do país registrando taxas de incidência estranhamente muito mais baixas, como o Nordeste, é motivo de preocupação. Afinal, se os casos da IST não estão sendo nem mesmo diagnosticados e portanto tratados, é possível que a região esteja vivendo uma epidemia silenciosa e descontrolada.
Ainda falando sobre apagão de dados, no Brasil a notificação de um caso de sífilis adquirida é trabalhosa para o profissional da saúde, ainda sendo feita manualmente e não de forma eletrônica, como a covid-19. Isso significa que os números do boletim, já assustadores, devem representar apenas parte do real problema que temos que enfrentar, dada a muito provável subnotificação existente.
Antes que alguém acuse a Profilaxia Pré-Exposição ao HIV (PrEP) de responsável pela explosão dos casos de sífilis, é importante saber que essa tendência de aumento já é identificada desde a virada do século, ou seja, muito antes da chegada da PrEP. Essa é também uma tendência mundial, não se restringindo aos países que adotaram a profilaxia contra o HIV.
Até é possível afirmar que a PrEP, por seu acompanhamento de saúde sexual que inclui a rotina de rastreamento de ISTs bacterianas, poderia na verdade ser uma das soluções para melhorar a cobertura de testagem e diagnóstico de sífilis no país, especialmente entre indivíduos que não apresentam sintomas.
A partir de 2023, as campanhas de prevenção desenvolvidas pelo Ministério da Saúde finalmente pararam de focar apenas no uso do preservativo e voltaram a abordar todas as diferentes estratégias de prevenção combinada. No entanto, o alcance dessa informação na população continua limitado demais para que ocorra real impacto na redução dos casos.
Diante de um cenário semelhante ao brasileiro, alguns países, como os Estados Unidos, já estão iniciando a implementação monitorada de métodos de prevenção biomédica que envolvem a tomada de comprimidos de antibióticos como forma de conter o avanço da sífilis (DoxiPEP).
Voltando ao Brasil, é evidente que o que estamos fazendo como plano de controle da epidemia sífilis não está funcionando. Seria a hora de revê-lo? Melhorando por exemplo a divulgação das campanhas de prevenção ou incorporando as novas tecnologias que a ciência tem desenvolvido, teremos alguma chance de virar esse jogo.
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