DragRace Brasil ensina que HIV deve ser tema do cotidiano
Na última semana foi ao ar o episódio final da primeira temporada do reality DragRace Brasil. Conhecido como "o futebol dos gays", desde agosto o programa tem arrastado multidões nas noites de quarta-feira para assistir a disputa entre 12 drag queens pelo título de campeã da temporada.
A vencedora foi a Organzza, uma carioca de 30 anos que se inspira no Carnaval para produzir as suas lindas criações. Parabenizo ela pela vitória, mas quero deixar também registrada a minha solidariedade.
Digo isso pois na reta final do reality, depois de uma situação de pressão, a vencedora decidiu revelar aos espectadores que vive com HIV.
No meio desta mesma temporada, Hellena Malditta, outra finalista, já havia revelado que também havia se infectado com HIV quando ainda jovem. Sua atitude num primeiro momento provocou boa repercussão de acolhimento. No entanto, posteriormente seguidores da Organzza supostamente começaram a usar essa informação para fazer bullying sorofóbico contra Hellena nas redes sociais.
Quando a briga esquentou, Organzza se defendeu dizendo que jamais toleraria qualquer tipo de atitude sorofóbica já que ela própria também vivia com HIV. Mais ainda, disse que a princípio não pretendia revelar isso, mas que a situação a levou a fazê-lo.
Minha solidariedade à Organzza está no fato de que ninguém no mundo deve ser obrigado a revelar sua sorologia do HIV ou fazer isso sob pressão. Uma vez que vivemos num mundo que ainda discrimina e estigmatiza pesadamente as pessoas que vivem com HIV/Aids, a soropositividade de cada indivíduo deve ser encarada como uma intimidade que pode ser ou não revelada.
Hellena Malditta, numa atitude admirável de coragem e generosidade, escolheu abrir sua intimidade para os telespectadores e para o Brasil. Com isso, trouxe para o palco do reality uma rica discussão sobre a dificuldade de lidar com o diagnóstico e a sobre a moderna prevenção do HIV, ainda desconhecida por boa parte da população brasileira.
Organzza por sua vez ensinou para o Brasil a importância de se respeitar a individualidade e os limites determinados para as diversas camadas da personalidade de um indivíduo. E deixa evidente o quanto o tema HIV/Aids ainda pode ser um tabu na sociedade.
Educação sobre HIV/Aids e sobre o respeito à privacidade deveriam ser competências de todos os cidadãos brasileiros. São habilidades úteis em assuntos absolutamente transversais à vida de qualquer pessoa, sobretudo quando se trata das populações chave de maior vulnerabilidade a essa epidemia, como é por exemplo o público cativo do DragRace Brazil. Nada melhor do que introduzir tais discussões de maneira leve, no momento de diversão, como fez o programa.
Das 4 finalistas desta temporada, 2 revelaram viver com HIV. Esse fato por si só já ilustra a importância hoje do tema HIV/Aids para a população jovem LGBT+ no Brasil. Um tema que não deveria ser velado, mas, sim, fazer parte do cotidiano desse grupo.
Não me importo se o HIV por enquanto for lembrado apenas nas quartas-feiras à noite. O importante é não deixar o assunto sair da pauta e nem fingir que essa epidemia já está resolvida no Brasil.
Parabéns ao DragRace Brasil e às suas participantes pela beleza e relevância dos temas abordados.
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