Câncer de ovário é o mais letal e silencioso dos tumores ginecológicos
Silencioso. É assim que os médicos se referem ao câncer de ovário, cujos sintomas só aparecem quando a doença já está instalada, e ainda podem ser confundidos com os de outras enfermidades.
Considerado o terceiro tumor ginecológico mais comum entre as mulheres, perdendo apenas para o câncer de mama e colo do útero, ele geralmente se manifesta no período posterior à menopausa, mas também pode acometer jovens em idade reprodutiva.
Até o momento não se conhece exatamente a origem dessa doença, mas sabe-se que alguns fatores de risco aumentam as chances de ela se desenvolver: além da idade superior aos 50 anos, obesidade, sobrepeso e histórico familiar de câncer ovariano ou de mama estão relacionados, entre outras condições.
Como não existe um exame preventivo —o Papanicolau é específico para detectar apenas o câncer de colo de útero— a recomendação dos médicos é que você não falte às visitas anuais ao ginecologista, bem como fique de olho no seu histórico de saúde familiar e nas situações que facilitam o aparecimento dessa doença.
Como ele é considerado o mais letal dos tumores ginecológicos, quanto mais cedo for detectado, maiores serão as opções de tratamento.
Entenda a sua anatomia
Os ovários são estruturas que compõem os órgãos genitais internos femininos. Em geral eles têm cor perolada, forma alongada e são menores que um ovo de galinha.
Conectados ao útero, são encarregados da produção de hormônios sexuais femininos (estrógenos e progesterona) e masculinos (pequenas quantidades de testosterona), e de células reprodutoras —os óvulos, que por eles também são liberados.
Por que esse tumor aparece?
William Augusto Casteleins, cirurgião oncológico do HMC (Hospital Marcelino Champagnat - PR) explica que existem mais de dez tipos diferentes de câncer de ovário, e eles se desenvolvem a partir do crescimento e da multiplicação desordenada de diferentes células encontradas nesse órgão.
Dadas as suas características, eles são classificados em dois grande grupos —os epiteliais e os não epiteliais. "O mais frequente deles começa nas células do tecido que reveste o ovário, chamadas de epiteliais. Os cânceres, ou carcinomas epiteliais, representam 95% das neoplasias (tumores) ovarianas", diz.
Embora até o momento não se saiba exatamente por que isso acontece, os cientistas já identificaram fatores que se relacionam e aumentam as chances de ter um câncer ovariano Confira:
- Genética (herança materna ou paterna das mutações dos genes BRCA1 ou BRCA2)
- Histórico familiar de câncer de ovário ou mama
- Ter idade superior a 50 anos
- Endometriose
- Terapia de Reposição Hormonal
- Menopausa tardia ou primeira menstruação precoce
- Nuliparidade (mulheres que nunca tiveram filhos)
- Sobrepeso e obesidade
- Tabaco
- Falta de exercícios
Conheça os outros tipos
Os tumores não epiteliais são os germinativos, cuja origem são as células germinativas —as mesmas que produzem os óvulos, e os de células do estroma (ou cordões sexuais e estroma), contidas no tecido conjuntivo.
Os primeiros são mais comuns entre mulheres de 30 anos. Há ainda os tumores mistos, que combinam os epiteliais e não epiteliais.
Essas células tumorais, por vezes, podem se espalhar para as áreas que circundam os ovários e até mesmo escapar pelo sistema linfático e pelo sangue, alcançando outras partes do corpo.
Como reconhecer os sintomas
No início da doença, o câncer de ovário é silencioso, ou seja, não apresenta sintomas. E mesmo quando ele já está mais avançado, seus sinais podem se confundir com manifestações comuns a outras enfermidades, como a sensação de indigestão.
Fique atenta aos sintomas a seguir, comuns a esse tipo de tumor:
- Dor ou inchaço no abdome
- Sensação de inchaço constante
- Dor abdominal ou na pelve
- Compressão do estômago após comer
- Perda do apetite
- Problemas gastrointestinais como gases, inchaço, constipação ou diarreia
- Urgência para urinar ou mudança nos hábitos urinários
Outros possíveis sintomas
Além das manifestações acima descritas, algumas mulheres poderão observar as seguintes condições:
- Mal-estar estomacal e enjoo constantes
- Dor durante as relações sexuais
- Mudança nos hábitos intestinais
- Cansaço constante
- Dor nas costas
- Perda de peso não desejada
- Ascite (acúmulo de líquido na região da barriga)
Quando é a hora de procurar ajuda médica?
Os sintomas do câncer de ovário não são específicos. E você pode notar apenas um desconforto abdominal ou mudanças nos hábitos intestinal e urinário, o que já poderia indicar que a doença está instalada. A explicação é de Glauco Baiocchi Neto, diretor do Departamento de Ginecologia Oncológica do A.C. Camargo Cancer Center.
"Quando se percebe um sintoma que não existia, apareceu e persiste, é preciso estar ciente de que não se trata apenas de uma mudança na alimentação. Assim, o quadro merece cuidado e deve ser investigado. A chance de ser algo mais grave, como um câncer de ovário, é baixa, mas esta dúvida precisa ser esclarecida", observa o especialista.
Como os sintomas são comuns a outras doenças, muitas pessoas poderão se consultar com um médico de família, um clínico geral, e até mesmo um gastroenterologista. Todos esses especialistas são treinados para avaliar inicialmente esse tipo de queixa. Contudo, o ginecologista possui maiores condições para, rapidamente, identificar o problema, especialmente porque, muitas vezes, é ele o médico de referência da mulher, dadas as visitas anuais.
Como é feito o diagnóstico?
Na hora da consulta o médico vai ouvir sua queixa, levantar seu histórico de saúde familiar e pessoal e ainda fará o exame físico.
Os ginecologistas farão o exame ginecológico completo, que inclui a palpação do abdome que ajuda a identificar alguma área endurecida, tumor na pelve, inchaço local e a típica ascite, ou seja, o acúmulo de líquido no abdome.
Além disso, ele solicitará exames laboratoriais e de imagem, como o ultrassom pélvico (transvaginal) e de abdome total. Caso esses testes apresentem alguma anormalidade, outros exames poderão ser requisitados, como a tomografia computadorizada e a ressonância magnética.
Entenda os diferentes estágios desse tumor
Quando os exames confirmam a presença do tumor, o especialista deverá esclarecer a você em qual estágio ele se encontra, a depender de seu tamanho e do quanto ele se expandiu. Confira:
- Estágio I - tumor restrito a apenas um ovário ou os dois;
- Estágio II - o câncer avançou para a pélvis ou útero;
- Estágio III - o tumor superou o limite do abdome, alcançou o intestino, as glândulas linfáticas da barriga ou da pélvis;
- Estágio IV - o câncer se espalhou para outras partes do corpo (pulmões, fígado).
O médico também poderá se referir a graus (histológicos), que vão de I a III. Isso classifica a velocidade do crescimento ou do avanço para outras partes do corpo.
O que esperar do tratamento?
Com dados sobre o estágio da doença e seu grau (estadiamento), as condições gerais de saúde da paciente e sua idade, o médico decidirá qual será a melhor estratégia de tratamento. Quando possível, o objetivo do tratamento é livrar a paciente da doença. Nos quadros graves, a meta será aliviar sintomas e controlar o câncer.
De acordo com dados da Febrasgo (Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia), mais de 7 em cada 10 casos são avançados. Assim, na maioria das vezes, a terapia combinará cirurgia e quimioterapia. Esta poderá ser utilizada antes ou depois da intervenção cirúrgica.
A cirurgia é, geralmente, de grande porte, pode durar de 6 a 8 horas e consiste na retirada do útero, ovário, trompas, cadeias de drenagem linfática, e todas as estruturas que estiverem comprometidas pelo tumor, como o intestino, o peritônio etc. Todas as superfícies suspeitas também serão analisadas. Esta cirurgia é chamada de citorredução.
Há casos em que a quimioterapia vem antes da intervenção cirúrgica, porque há risco de doença residual. De todo modo, ela é inicialmente realizada à base de platina (carboplatina e cisplatina), com ou sem o uso de outros fármacos, como os taxanos . A cirurgia só acontecerá entre a terceira e quarta etapa dessa terapia, ou no final do sexto ciclo dela.
Cânceres de ovário em estágio inicial são tratados por meio de cirurgia combinada com radioterapia ou quimioterapia, a depender das condições clínicas gerais de cada paciente, e quando houve mudança no estágio após a cirurgia, isto é, descobriu-se na cirurgia que o tumor estava mais avançado do que os exames mostravam.
Mesmo após tratada, a doença pode voltar?
Após o tratamento, as pacientes devem ser monitoradas a cada 3 meses, e mesmo depois desse período o acompanhamento prossegue.
A razão para isso é que boa parte delas pode ter recaídas ou persistência da doença. A sugestão dos especialistas é que você nunca falte aos retornos médicos e se mantenha ativa.
E se não houver tratamento?
Quando o tumor não pode ser tratado, dada as suas gravidade e extensão, as práticas médicas se voltarão para aliviar, o quanto possível, os sintomas da doença, o que inclui suporte psicológico, que pode se estender à família. Essas estratégias são chamadas de cuidados paliativos.
Entenda a diferença entre cisto e tumor ovariano
Paulo Cesar Zimmermann Felchner, ginecologista e obstetra, professor adjunto da Escola de Medicina da PUC-PR explica que tumor é todo aumento anormal de tecido, enquanto os cistos são sacos que têm líquido dentro.
"Tumores podem ser benignos ou malignos, formam-se em qualquer parte do corpo e geralmente são uma massa sólida (mas também podem ser mistos), apresentam irregularidade em seus contornos e vascularização", esclarece o médico.
Já os cistos podem aparecer em diferentes áreas do organismo, como os ovários, ossos, mamas, tireoide e até no fígado. Nos ovários, a maioria é benigno, desaparece espontaneamente, e é facilmente identificado e tratável.
Fontes: Glauco Baiocchi Neto, doutor em oncologia pela USP (Universidade de São Paulo) e diretor do Departamento de Ginecologia Oncológica do A.C. Camargo Cancer Center; Paulo Cesar Zimmermann Felchner, ginecologista e obstetra, professor adjunto da Escola de Medicina da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná) das disciplinas de ginecologia e obstetrícia; William Augusto Casteleins, cirurgião oncológico integrante da equipe Malignidades Peritoneais do Hospital Marcelino Champagnat (PR), cancerologista do HUC (Hospital Universitário Cajuru) e mestre em ciências da saúde pela PUC-PR. Revisão técnica: William Augusto Casteleins.
Referências: Inca (Instituto Nacional de Câncer) do Ministério da Saúde; Manual de Orientação Ginecologia Oncológica da Febrasgo; Dana-Farber Cancer Institute; Desai A, Xu J, Aysola K, et al. Epithelial ovarian cancer: An overview. World J Transl Med. 2014;3(1):1-8. doi:10.5528/wjtm.v3.i1.1.
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