Sedentarismo altera o funcionamento de todos os sistemas do organismo
Quem nunca aproveitou um final de semana inteiro para se jogar no sofá e "maratonar" aquela série preferida que faz a gente perder a noção do tempo? De controle remoto na mão e alguma coisa para comer por perto, adotamos um comportamento que é considerado o de maior impacto negativo para nossa saúde: ver TV por longas horas.
Definido como um estilo de vida que privilegia o estar sentado ou deitado a maior parte do tempo, esse comportamento sedentário, também conhecido como sedentarismo, rouba espaço das atividades físicas e dos exercícios físicos, alterando o funcionamento de todos os sistemas do organismo. O resultado é o aparecimento de doenças crônicas e morte prematura por todas as causas possíveis.
Apesar desse cenário, 70% da população em todo mundo se encaixa no grupo dos que não dedicam de 150 a 300 minutos por semana a alguma atividade que as coloque em movimento; entre os jovens, esse percentual é de cerca de 80%.
E o quadro só piorou durante a pandemia. Mudar hábitos é difícil, mas rever a nossa relação com as telas de todos os tipos compensa: além da prevenção e do controle de enfermidades, evoluímos em direção a um estado de bem-estar geral.
O que é sedentarismo?
Trata-se de um estilo de vida no qual uma pessoa passa a maior parte do seu tempo acordada nas posições sentada ou deitada, o que resulta em um baixo gasto de energia. Essa condição se caracteriza também pelo pouco espaço dado à prática de atividades físicas ou exercícios.
A recomendação do Ministério da Saúde, que segue as diretrizes da OMS (Organização Mundial da Saúde), é que o tempo dedicado às atividades físicas moderadas deve corresponder a de 150 a 300 minutos por semana, a depender da sua idade e condição de saúde.
Causas do comportamento sedentário
Muitas situações estão relacionadas a esse estilo de vida, e elas são também influenciadas por aspectos sociais e culturais de determinados grupos. Veja, a seguir, alguns exemplos:
- Congestionamento
- Poluição
- Áreas públicas reduzidas destinadas a parques e à prática de atividades físicas ou lazer
- Calçamento inapropriado para caminhadas
- Alta exposição a telas (TV, celulares, videogame etc.)
- Uso excessivo de carro, ônibus, metrô
- Atividades profissionais (sedentarismo ocupacional) que exigem permanecer sentado por longas horas (inclusive quando se trabalha em casa)
Importante saber que, a depender do comportamento sedentário, os resultados na saúde podem ser melhores ou piores. No entanto, ver TV é considerado o quadro com maior impacto negativo —especialmente porque, em geral, é acompanhada pelo consumo de alimentos. Os dados foram publicados no Jornal Coreano de Medicina de Família.
Quem precisa ficar atento?
Todas as pessoas, inclusive as crianças. Estima-se que 70% de toda a população do globo não alcançam os níveis recomendados de atividade física. Um recente estudo publicado pela prestigiosa revista médica The Lancet mostrou que, na faixa de idade entre 10 e 24 anos, esse percentual está próximo dos 80%.
A média de tempo que os indivíduos permanecem inativos é de 8 horas ao dia.
Consequências do sedentarismo
A falta de atividade física e de exercícios influencia todos os sistemas do seu corpo, que poderão sofrer mais ou menos prejuízo, a depender das características genéticas de cada pessoa. Apesar disso, os efeitos da inatividade são os seguintes:
- Menor perda de calorias
- Redução da massa e força musculares (os músculos vão se adaptando)
- Enfraquecimento ósseo e perda de massa óssea
- Alterações metabólicas (pode haver dificuldade no processamento de gorduras e açúcares)
- Redução das defesas do corpo
- Modificações na circulação sanguínea
- Maior suscetibilidade a inflamações
- Desequilíbrio hormonal
- Alterações do sono (inclusive ente as crianças)
Doenças e complicações relacionadas ao sedentarismo
Manter-se inativo é considerado um fator de risco, ou seja, uma condição que facilita o aparecimento de muitas doenças crônicas e problemas de saúde, como os que você vê a seguir:
- Obesidade
- Doenças do coração (infarto, obstrução de artérias)
- Pressão alta (hipertensão)
- Aumento do colesterol
- AVC (Acidente Vascular Cerebral)
- Síndrome metabólica
- Diabetes do tipo 2
- Câncer (cólon, mama, útero, próstata)
- Osteoporose
- Depressão
- Ansiedade
- Morte prematura por todas as causas
- Redução das funções cognitivas
- Doenças musculoesqueléticas (dor no joelho crônica, por exemplo)
O cardiologista José Kawazoe Lazzoli inclui nessa lista a perda da aptidão cardiorrespiratória, que é a capacidade máxima de absorver oxigênio e distribuí-lo aos orgãos (como os pulmões) e músculos durante a prática de exercícios.
"Quanto mais alta for essa aptidão, menor é o risco de ter doenças coronarianas, AVC, insuficiência cardíaca, arritmia [fibrilação atrial], diabetes e vários tipos de câncer". "Tenha em mente que o sedentarismo é considerado pandêmico, figura em 4º lugar entre as causas mais comuns de óbito, que soma 5,3 milhões anuais em todo o mundo", completa o médico.
Como saber se você é sedentário?
A prática de atividade física moderada deve corresponder de 150 a 300 minutos por semana.
Uma forma de observar seu comportamento é por meio da contagem de passos diários, facilmente verificável com o uso de um pedômetro. Todos que possuem um celular têm acesso a ele. A sugestão é do fisioterapeuta e educador físico, Hugo Celso Dutra de Souza, professor do Departamento de Ciências da Saúde da FMRP-USP.
"Se você ficar abaixo de 5.000 passos, você não é ativo; se contar 3.000, menos ainda. Se pensarmos que, em 1 minuto, contamos 120 passos e, em 10 minutos, 1200 —quem anda 3 mil passos tem atividade física inferior a meia hora ao dia. O ideal seriam 10 mil", diz.
Para quem não alcança esse parâmetro, a falta de exercícios no dia a dia pode levar à manifestação de sinais e sintomas, tais como:
- Cansaço
- Mudança nos padrões do sono
- Dores articulares
- Dificuldade de concentração
- Alterações na memória e sono
- Digestão lenta
- Mudança de humor
- Alterações na pele
- Dificuldade para fazer esforço (como subir uma escada)
Existem exames que detectam o sedentarismo?
Alguns testes ajudam a avaliar as condições físicas decorrentes da falta de atividade física, como os exames ergométrico (avalia o funcionamento cardiovascular, quando submetido a esforço físico), o cardiopulmonar ou ergoespirométrico (considerados padrão ouro) e bioimpedância (analisa a composição corporal, indicando a quantidade aproximada de músculo, osso e gordura).
Outros exemplos são exames de sangue para avaliação das funções metabólicas, como a glicemia e o colesterol, além de alterações no fígado, como o depósito de gordura no órgão (esteatose hepática), entre outros.
Como não existe um exame específico para monitorar as complicações decorrentes do sedentarismo, os achados desses exames ajudam o médico a elaborar um plano de tratamento.
"Ele começa com orientações de mudanças no estilo de vida. A atividade física está na base da estratégia terapêutica. É importante saber disso porque muitos pacientes não querem tomar remédios. Assim, a depender do quadro, exercícios e dieta podem resolver o problema", fala a endocrinologista Luísa Abero Valle, do HU-UFPI.
Como mudar seus hábitos?
Alterar a rotina é sempre desafiador, mas os especialistas concordam que a melhor forma de fazer isso é começar devagar. Afinal, é melhor fazer alguma atividade física do que nenhuma. As evidências científicas sugerem que os melhores resultados são obtidos por meio da adoção de práticas simples como:
- Redução do período de comportamento sedentário, alternando-o com atividade física leve ou treino muscular simples
- Interrupções do comportamento sedentário durante o trabalho e o tempo livre
- Atividades de lazer que incluam atividade física
O que é considerado razoável?
Não existe uma receita única que serve para todos, porque devem ser considerados vários fatores, como a sua idade e condições gerais de saúde.
"Independente disso, usar o pedômetro é uma boa medida para começar", diz o educador físico André Guimarães, do Huol-UFRN. Em geral, as atividades mais indicadas são as aeróbicas e os exercícios de força e resistência, além de alongamento, que serão integradas gradativamente. Com o tempo, elas vão se intensificando.
Guimarães lembra ainda que é essencial respeitar as preferências de cada indivíduo e também estimular novas experiências. "O resultado disso é que, ao observarem a melhora gradual de seus quadros de saúde, a resistência à atividade física e aos exercícios vai reduzindo", acrescenta o especialista.
Entenda a diferença entre atividade física e exercícios
Atividade física é toda prática que envolve movimentos voluntários corporais, com gasto de energia significativo e que promova interações sociais e com o ambiente. E ela não se limita aos esportes. Inclui também o que uma pessoa faz em seu tempo livre, nos deslocamentos, na escola e até executando tarefas em casa.
Já o exercício físico é outro exemplo de atividade física. A diferença entre um e outro é que o primeiro é uma prática planejada, estruturada e repetitiva e tem um fim determinado: melhorar ou manter as capacidades físicas e a saúde, o peso equilibrado, além de ser orientado por profissionais de educação física.
O que conta como atividade física?
Nadar, caminhar, passear com o cachorro, andar de bicicleta e até ajudar na limpeza da casa conta como atividade física e garante mais movimento na vida das crianças. Para saber a intensidade da atividade que está praticando, observe essas características:
Leve: exige pouco esforço e exige pequena mudança na respiração e nos batimentos do coração. Dá para conversar normalmente e até cantar.
Moderada: exige mais esforço, a respiração fica mais rápida e as batimentos do coração também. Dá para conversar com dificuldade e não dá para cantar.
Vigorosa: Exige muito esforço físico, a respiração e o batimento do coração são mais rápidos ainda. Não dá para falar, nem cantar.
O que você ganha com isso?
Além da prevenção e do controle de doenças crônicas, com possível redução de intervenções médicas (doses de medicamentos, por exemplo) e a melhora da sensação de bem-estar geral, manter-se ativo ainda pode beneficiá-lo nos seguintes aspectos:
- Reduz a mortalidade
- Ajuda no controle do peso
- Diminui sintomas de asma
- Alivia o estresse, sintomas de ansiedade e depressão
- Melhora a qualidade do sono
- Promove a disposição
- Fortalece laços sociais, vínculos e solidariedade
- Ajuda na inclusão social
Dicas para movimentar-se desde já
Para incluir mais atividade física em casa ou no trabalho, adote as seguintes estratégias:
- Limpe a casa, cuide das plantas e lave o carro ou o quintal. Se possível, faça essas atividades físicas com maior vigor;
- Mantenha-se em movimento diante da TV: vale levantar pesos de mão, fazer posturas de ioga, pedalar. Em vez de usar o controle remoto, levante e faça as mudanças que deseja;
- Encontre um treino que o agrade (no YouTube, por exemplo) para fazer durante o seu tempo livre no conforto da sua casa;
- Faça caminhadas pelo seu bairro;
- Fique em pé ao falar ao telefone;
- Tenha acessórios de treino em casa. Os mais acessíveis são a bola suíça, pesinhos de mão, faixas elásticas;
- Acerte o despertador do celular para levantar a cada 1 hora sentado;
- Use mais as escadas do prédio do trabalho ou em casa. Se o seu andar é alto, suba ao menos até o 3º andar e, depois, use o elevador;
- Aproveite a hora do almoço ou do café para dar uma volta no seu prédio;
- Vá até a mesa do seu colega de trabalho em vez de mandar um e-mail.
Para saber mais, consulte o Guia de atividade física para a população brasileira.
Fontes: André Guimarães, educador físico do Huol-UFRN (Hospital Universitário Onofre Lopes, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte), que integra a rede Ebserh (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares); Hugo Celso Dutra de Souza, fisioterapeuta e profissional de educação física, mestre e doutor em fisiologia humana; professor associado do Departamento de Ciências da Saúde da FMRP-USP (Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo); José Kawazoe Lazzoli, cardiologista, especialista em medicina do exercício e do esporte, presidente da Copamede (Confederação Pan-americana de Medicina do Esporte), tesoureiro da FIMS (Federação Internacional da Medicina do Esporte), docente da UFF (Universidade Federal Fluminense), e ex-presidente da SBMEE (Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte); Luísa Abero Valle, médica endocrinologista do HU-UFPI/Ebserh (Hospital Universitário da Universidade Federal do Piauí), vinculado à Rede Ebserh, preceptora da residência em endocrinologia da mesma instituição e professora da Faculdade de Medicina da Unifacid, em Teresina. Revisão médica: José Kawazoe Lazzoli.
Referências:
Ministério da Saúde
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