Taurina: suplemento não aumenta a força, mas ajuda na redução da glicemia
Diana Cortez
Colaboração para o VivaBem
23/09/2020 04h00
A taurina (ácido 2-aminoetanossulfónico) é um dos aminoácidos que existe em maior abundância no corpo humano, principalmente, nos músculos (inclusive no coração), no cérebro e nos olhos.
A substância participa de diversos processos no organismo e realiza importantes funções nas células, além de oferecer propriedades antioxidantes, anti-inflamatórias e desintoxicantes. Isso fez com que ganhasse mais destaque entre os pesquisadores nas últimas décadas, tanto que existe uma entidade focada no assunto, a International Taurine Society, que realiza encontros anuais há mais de duas décadas para discutir as novidades relacionadas ao aminoácido.
No entanto, ainda há muito o que desvendar sobre a suplementação de taurina, principalmente, em relação aos seus benefícios para o esporte. A seguir, descubra o que já se sabe sobre esse aminoácido.
Tire suas dúvidas sobre a taurina
O que é a taurina?
A taurina é um aminoácido produzido em sua maior parte no pâncreas, no fígado e nos rins, mas também pode ser sintetizado em menor quantidade no cérebro e em outros tecidos do corpo. A taurina é "fabricada" a partir da metionina e da cisteína, que são substâncias da mesma categoria, com participação da vitamina B6.
A substância também é adquirida por meio dos alimentos e está presente na carne bovina, peru, carne escura do frango, peixes e frutos do mar, sendo encontrada em menor quantidade no leite, nas nozes e no feijão. Por esse motivo, é considerado um aminoácido "semi-essencial".
Qual é o papel da taurina no corpo?
A substância participa de diversas funções no nosso organismo. Ela tem ação antioxidante e atua como anti-inflamatório nos músculos. Ainda oferece um efeito protetor do cérebro e da retina. Também age na estabilização da membrana plasmática das células e na sinalização celular, entre outras coisas.
Na digestão, é responsável por eliminar as toxinas e pela formação dos sais biliares no fígado, que decompõe a gordura.
A taurina ainda tem um papel importante no coração por participar do processo de contração do órgão, assim como dos demais músculos do corpo.
Como o suplemento é comercializado? E quanto tomar?
A taurina pode ser encontrada em lojas de suplementos esportivos em cápsulas, em pó ou ainda vendida em bebidas "energéticas", combinada com a cafeína.
A dose de taurina recomendada pelos fabricantes de suplementos varia entre 500 mg a 6 g.
A taurina contribui para o desempenho físico?
Ainda não há um consenso de que consumir o suplemento possa contribuir para o rendimento físico.
Enquanto algumas pesquisas mostram que o suplemento ajuda a prolongar o tempo de exaustão em atividades de alta intensidade e endurance (corrida, triatlo, ciclismo), outros estudos não confirmam esses efeitos, mas indicam que a substância ajuda diminuir os marcadores de estresse oxidativo, favorecendo recuperação desses atletas. Já algumas análises sugerem que apenas pessoas com baixos níveis de taurina no sangue se beneficiam com a suplementação.
Por tudo isso, são necessários mais estudos para confirmar a ação da taurina em melhorar o desempenho físico e entender seu mecanismo de ação.
O suplemento contribui para a hipertrofia?
Não há estudos que avaliam se a substância auxilia no ganho de massa magra. No entanto, já se sabe que a taurina não participa da síntese proteica que leva à hipertrofia, portanto, ela não teria um papel direto nesse processo. Por outro lado, o aminoácido poderia ter uma ação indireta ao contribuir para o esportista treinar melhor ou com maior volume, levando às adaptações necessárias para possibilitar o crescimento muscular, mas é algo que ainda precisa ser confirmado.
Ela ajuda na recuperação pós-treino?
Segundo um estudo japonês, o efeito antioxidante e a ação anti-inflamatória do aminoácido apenas ajudam a reduzir a dor muscular de início tardio, aquela que sentimos cerca de dois dias após o treino, por conta das microlesões causadas pelo exercício. No entanto, o suplemento não foi capaz de recuperar os músculos mais rapidamente.
A taurina otimiza os efeitos da cafeína?
Ao contrário do que se pensa, o papel da taurina nas bebidas energéticas que trazem o aminoácido e a cafeína é contrabalancear os efeitos colaterais da cafeína, que age no sistema nervoso central deixando a pessoa mais agitada, eufórica e com tremores dependendo, da quantidade consumida. Isso porque a taurina atuaria melhorando o receptor de GABA, um neurotransmissor que promove o relaxamento e diminui a euforia.
É comum ter déficit de taurina no organismo?
Pacientes com problema no fígado podem apresentar baixos níveis de taurina por conta do mau funcionamento do órgão, impactando a produção do aminoácido e causando repetitivos episódios de cãibras. Pessoas com doenças renais também podem ter déficit da substância pelo fato de ela ser eliminada em maior quantidade pela urina.
A deficiência ainda pode ser causada por uma alimentação desequilibrada e surgir em pessoas desnutridas ou que se privam de alimentos ricos no aminoácido —como é o caso dos veganos e vegetarianos. Aliás, veganos e vegetarianos também devem ficar de olho nos níveis de vitamina B6 da alimentação, importante para a produção da taurina no corpo.
Outro grupo que corre risco de sofrer com baixos níveis é o das gestantes, por conta da maior demanda da substância para a formação do feto. Por esse motivo, elas devem ficar de olho na alimentação.
Esportistas que consomem o suplemento beta-alanina também devem estar atentos nos níveis de taurina no organismo (e vice-versa), pois ambos são aminoácidos e possuem estruturas similares que competem entre si para entrar nas células.
Existem exames laboratoriais que fazem a dosagem de taurina no sangue, que deve estar entre 31 e 102 umol/L em pessoas acima de 18 anos.
O déficit da substância pode impactar a saúde do coração, da retina e do cérebro, além de afetar a imunidade, causar atrofia muscular, envelhecimento precoce e interferir na fertilidade.
É verdade que o suplemento faz dormir melhor?
Como a taurina melhora o receptor de GABA, neurotransmissor que promove o relaxamento, ela pode contribuir para uma melhor noite de sono. Mas esse efeito parece variar entre as pessoas, sendo que algumas ficam mais alertas após consumir a substância, enquanto outras, mais relaxadas. Ainda não se sabe por que essas diferenças acontecem e são necessários mais estudos para esclarecê-las.
O suplemento contribui para o emagrecimento?
Vários mecanismos dos quais a taurina participa acabam sugerindo que ela poderia contribuir para o emagrecimento, mas, diferentemente do que é visto nas pesquisas com ratos, os estudos realizados com humanos não confirmam esse benefício.
Um deles, publicado pelo European Journal of Nutrition, não demonstrou diferença na perda de peso entre pessoas que fizeram dieta e indivíduos que seguiram o mesmo regime alimentar e também consumiram taurina.
A explicação para a taurina ajudar na perda de peso de ratos e camundongos é que o organismo desses animais age de maneira diferente com a substância, tanto que a taurina é considerada um aminoácido essencial para os roedores.
O suplemento pode causar algum efeito colateral?
Há alguns poucos relatos de que o suplemento poderia causar dores de cabeça, diarreia e desconfortos gastrointestinais quando consumido em doses mais altas.
A taurina pode causar algum efeito deletério à saúde?
Nenhum estudo com a substância demonstrou que ela seria capaz de oferecer prejuízos à saúde. Mesmo assim, vale lembrar que qualquer suplemento só deve ser consumido com recomendação de um médico ou nutricionista.
Combinar creatina com taurina melhora os resultados do treino?
Não existem estudos que avaliem os efeitos dessa dupla, portanto não é possível afirmar que elas juntas melhoram os resultados do exercício. O que se sabe é que a creatina realmente tem um efeito direto no ganho de hipertrofia, enquanto a taurina poderia adiar a fadiga no treino de alta intensidade, mas são necessários mais estudos para confirmar esse benefício.
Hipertensos podem suplementar com taurina?
Uma meta-análise realizada com humanos concluiu que o consumo de taurina ajuda a reduzir significativamente a pressão arterial, diminuindo o risco de mortalidade por AVC (acidente vascular cerebral) em 14% e mortalidade cardiovascular em 9%.
O suplemento também demonstrou melhorar a qualidade das veias e artérias, contribuindo para uma melhor função vascular, provavelmente, devido à sua ação antioxidante no organismo. Mas ainda são necessários mais estudos para definir as doses que devem ser consumidas por esses pacientes. É importante lembrar ainda que qualquer pessoa só deve consumir suplementos sob orientação de um médico ou nutricionista.
É verdade que a taurina melhora a cognição?
Estudos com modelos animais indicam que a taurina reduz a inflamação no cérebro ao estabilizar as membranas das células do órgão, diminuindo a permeabilidade da barreira hematoencefálica, impedindo a entrada de substâncias indesejadas no sistema nervoso que poderiam causar inflamações e doenças.
Dessa maneira, o aminoácido seria capaz de melhorar a cognição de pacientes com Alzheimer e Parkinson. Mas novas pesquisas precisam ser realizadas com humanos para confirmar esse efeito.
Pessoas com diabetes podem consumir o suplemento?
Uma das funções da taurina no organismo é modular o receptor de insulina, fazendo com que a glicose circulante no sangue seja captada pelos músculos de maneira mais eficiente. Dessa maneira, análises apontam que o aminoácido possa ser utilizado como coadjuvante no tratamento de pacientes com resistência à insulina e diabetes. Além de diminuir a glicemia, ele também oferece ação antioxidante capaz de reduzir o estresse oxidativo que causa danos celulares nesses pacientes.
Grávidas podem suplementar a taurina?
As gestantes somente devem consumir qualquer suplemento com recomendação de um médico ou nutricionista especializado no assunto. O profissional da saúde vai avaliar a alimentação da grávida e pedir exames para poder definir se doses extras desse aminoácido são ou não necessárias.
Fonte: Ricardo Goldfeder, nutricionista graduado pela (UFSC) Universidade Federal de Santa Catarina, especialista em fisiologia do exercício pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e professor da pós-graduação em nutrição esportiva funcional do VP Centro de Nutrição Funcional; Bryan Saunders, professor da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) e pesquisador do laboratório de fisiologia do Grupo de Pesquisa em Fisiologia Aplicada e Nutrição da USP; Aline David Silva, nutricionista, mestre e doutora em fisiologia humana pela USP e docente do curso de Nutrição do Centro Universitário São Camilo.