O que significa a descoberta do subtipo do HIV? É preciso novo tratamento?
Resumo da notícia
- A existência de diferentes subtipos do HIV já era conhecida na área da saúde. A descoberta da versão "L" significa uma nova variação rara do vírus
- Segundo os autores, a maior relevância da descoberta é auxiliar os cientistas a entender melhor o vírus e ajudar na prevenção e no tratamento
- Não há estudos indicando se o novo subtipo é resistente aos tratamentos ou métodos de prevenção disponíveis
No início de novembro deste ano, um grupo de cientistas publicou um artigo informando a descoberta de um novo subtipo de HIV. A pesquisa, disponível no periódico Journal of Acquired Immune Deficiency Syndromes, é a primeira a encontrar uma nova variedade do vírus desde 2000.
Para o meio científico, é um grande passo. Mas o que significa para a população em geral a descoberta? O subtipo é como uma nova doença em curso?
Na verdade, nada muda. Os pesquisadores já sabiam que há uma diversidade muito grande do vírus. "Essa inclusive é uma das razões para não existir uma vacina contra o HIV. Ele sofre mutações constantes", diz Melissa Medeiros, especialista em HIV e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia.
Essas mutações transformam o vírus "original" em outros subtipos, mas que pouco têm de diferente do tradicional. Medeiros exemplifica a diferenciação do HIV com uma família: "Todo mundo tem o mesmo sobrenome, mas o José tem o olho verde, o João o olho azul e a Maria, castanho. Todos são seres humanos, geneticamente parecidos, mas com características diferentes".
Isso quer dizer que o subtipo, na verdade, é só uma "cor de olho diferente" do HIV, e não um novo vírus.
Helio Bacha, infectologista da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Hospital Albert Einstein, diz que o trabalho tranquiliza. "Ele mostra que estamos vigilantes a respeito do vírus. Isso é bom, é como o da gripe, que estamos sempre observando sua evolução".
Segundo os autores do estudo, a maior relevância da descoberta é auxiliar os cientistas a entender melhor o vírus, o que pode ajudar na prevenção e no tratamento. "Para acabar com a pandemia de HIV, devemos continuar a pensar à frente desse vírus que muda constantemente, e usar os últimos avanços na tecnologia e nos recursos para monitorar sua evolução", afirmou uma das coautoras, Carole McArthur, à AFP.
"Não foi uma surpresa para a gente"
A comunidade científica divide o vírus em dois tipos, 1 e 2, com base em suas diferenças genéticas. O 1, por exemplo, é o que está mais disseminado no mundo e tem nove grupos, entre eles o M, responsável por mais de 90% dos casos de Aids no mundo. A nova variante, chamada de L e revelada em novembro, é um outro subtipo, dentro do M, por isso recebeu o nome HIV-1, grupo M, subtipo L.
No Brasil, há diferentes grupos concentrados em suas regiões. Um estudo publicado em setembro deste ano e desenvolvido por pesquisadores da UFSCar (Universidade federal de São Carlos) e da Uminho (Universidade do Minho), em Portugal, mostrou que o grupo C é mais comum na região Sul, enquanto o tipo B é mais disseminado nas demais regiões do país.
Quanto ao atual subtipo L, a comunidade científica já tinha suspeitas sobre sua existência, mas era necessário que ele fosse identificado em pelo menos três indivíduos para que pudesse ser classificado cientificamente.
Bacha conta que desde 2001 a comunidade científica já havia identificado essa variação e que ele devia circular pela República Democrática do Congo, na África, desde os anos 1980. É por esse motivo que não houve novidade para os pesquisadores. "A novidade, na verdade, é a parte burocrática da virologia, ou seja, agora ele está classificado".
"Não foi uma surpresa para a gente", confirma Medeiros. "Só precisávamos de uma tecnologia avançada para validar a informação".
"Identificar novos vírus como esse é como procurar uma agulha no palheiro. Ao avançar nossas técnicas e usar a nova geração de sequenciamento, puxamos essa agulha com um ímã", disse Mary Rodgers, uma das autoras do estudo, em comunicado oficial.
Medicação é a mesma
Em entrevista à revista Scientific American, Rodgers afirmou que o novo subtipo é extremamente raro, o que diminui as preocupações de que ele seja resistente aos tratamentos ou métodos de prevenção disponíveis.
Segundo Medeiros, realmente, alguns subtipos têm comportamento diferente à medicação, mas aparentemente não parece ser o caso do L. "Ele faz parte do tipo 1 do vírus, que é justamente a base para o tratamento usado hoje. Isso significa que as medidas de prevenção e tratamento continuam as mesmas".
O método mais recomendado de prevenção é o uso de preservativos (masculino ou feminino) durante as relações sexuais. Com o avanço da medicina, ainda há a possibilidade de intervenções com antirretrovirais logo após a exposição ao vírus (PEP) ou mesmo de forma preventiva (PreP), voltada para grupo de pessoas que tenham maior chance de entrar em contato com o vírus.
Além de ser transmitido por meio de relações sexuais desprotegidas, o vírus também pode ser passado pelo compartilhamento de seringas contaminadas, pela transmissão vertical (de mãe para filho durante a gravidez, parto ou amamentação) e por meio de transfusão com sangue contaminado. Por isso é importante que todas as pessoas realizem o teste com frequência.
O que vem por aí
É provável ainda que novas mutações apareçam. "São capacidades de adaptação e mutagênese desse vírus", diz Medeiros. Segundo ela, ainda é possível que ele evolua para uma forma até menos agressiva. "Os patógenos precisam se adaptar aos seres humanos. É como o primeiro HIV encontrado, nos macacos. Nos animais, ele não é agressivo. Os bichos podem passar a vida inteira com o vírus em latência".
Foi o que aconteceu com o vírus da herpes, que consegue viver no corpo pelo resto da vida sem demonstrar agressividade ao organismo. Mas até chegar a esse estágio, demora. "Pelo que sabemos, geralmente o vírus leva um século para um adaptação mais razoável e menos agressiva. Os da herpes, por exemplo, estão há mais de cem milhões de anos em mutação".
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