Jovens vão à TV derrubar mitos sobre HIV: "É possível ter vida saudável"
Com diferentes origens, idades e círculos sociais, cinco jovens que moram em São Paulo têm algo em comum: vivem com o HIV e decidiram falar sobre isso na TV. Eles mostraram o rosto na telinha para reforçar o fim do preconceito e quebrar tabus sobre o vírus que ainda rodeiam a cabeça de quem nutre estigmas dos anos 1980, início da epidemia.
Os jovens fazem parte do "Deu Positivo", doc-reality estrelado em formato de série em 1º de dezembro na MTV. A série abordou diferentes perspectivas sobre o HIV a partir da visão de cada um dos personagens para mostrar que é possível ser saudável com o vírus no organismo.
Somente no Brasil, 966.058 receberam o diagnóstico para HIV entre 1980 a 2019, segundo o último dado divulgado pelo Ministério da Saúde. No meio dessa imensidão, cinco pacientes protagonizam a série e contam como lidam com o vírus.
VivaBem ouviu quatro dos personagens. Eles revelam a maneira que tratam a sorologia pública, recebem acolhimento, tomam as medicações e sofrem sorofobias —que é o preconceito com os que vivem com HIV.
"Mostrar a cara é importante"
O artista visual Victor Bebiano, 23, teve o diagnóstico ao ser atiçado pela curiosidade, em 2015. Ele não tinha o hábito de fazer exames de rotina nem de se expor a situações que o deixassem vulnerável à infecção pelo HIV. O resultado positivo foi uma surpresa.
A expectativa de vida virou a única preocupação após o exame, mas o acolhimento da equipe médica o tranquilizou sobre os próximos passos. "Na hora, fiquei muito abalado, mas a única coisa que pensei era se iria morrer. O médico respondeu que não e informou que minha expectativa de vida era como qualquer outra", lembra.
Depois de quatro anos compartilhando sua sorologia apenas com pessoas próximas, o jovem decidiu torná-la pública no fim de 2019 pelas redes sociais. A principal motivação veio do dia a dia. Ele percebeu que as pessoas necessitavam de mais informações para deixar o preconceito de lado. Somado a isso, o acolhimento de jovens com a mesma condição ajudou na empreitada.
"Vejo hoje tantas pessoas com diagnóstico e que, por me acompanhar, tem uma relação diferente com o resultado. O que antes poderia deixá-las perdidas, agora enxergam apenas como um detalhe na vida. Abrindo essa porta nas redes sociais, recebo muita mensagem de gente querendo trocar essa vivência", celebra.
A gente mostrando a nossa cara, demonstrando que vivemos bem, de forma saudável e bonita, é muito importante. Às vezes, as pessoas olham para mim e falam 'nossa, nem parece que vive com HIV'. É possível ter uma vida saudável.
O papel do acolhimento
Nascido no Rio Grande do Norte, o jornalista e artista plástico André Silva, 32, descobriu o vírus em fevereiro de 2018. Morando atualmente em São Paulo, conta que o destino colocou o teste rápido em seu caminho.
Ele se dirigiu a uma UBS (Unidade Básica de Saúde) para se consultar com um clínico geral e, enquanto aguardava, uma funcionária passou com o colete do teste rápido para HIV. "Por que não fazer?", pensou André, que estava sem colocar em dia os exames.
Era 2 de fevereiro, dia de Iemanjá, divindade que cercou André ao longo de sua vida enquanto morou próximo do mar em Natal. Ele acredita que o simbolismo da data o ajudou no resultado.
"Não poderia entrar em pânico, não estava findando nada, mas iniciando outro ciclo. Sorri para a enfermeira. Ela até estranhou a calma. Falei 'eu preciso ficar calmo. O que tenho que saber agora é o próximo passo para tocar a minha vida'", recorda.
Com a sorologia, André olhou para a vida de outra forma. Os sonhos e desejos que o motivaram a atravessar o Brasil não poderiam ser enterrados com o diagnóstico. "Tive a certeza de que precisava viver a minha vida", diz.
O jornalista considera o acolhimento de uma rede de amigos e de instituições como essencial para tocar a vida e desmistificar algumas perspectivas que ainda rondavam a sua cabeça.
"Me peguei em algumas ignorâncias, principalmente ligadas a afetividade, mas me fortaleci em uma rede de apoio muito importante, entre amigos e amigas. Depois procurei ONGs em São Paulo. A partir daí, pude conhecer o relato de vida de outras pessoas que também vivem na mesma condição. Esse processo de ter procurado para trocar ideia com outros foi muito importante para quebrar visões que estavam cristalizadas em meu pensamento", frisa.
Quando a gente se abre para dialogar algo novo, aprendemos muita coisa. O conhecimento é poder e quando nos apropriamos dele, a gente consegue transformar muita coisa ao nosso redor.
HIV e o jovem negro
É pela informação que Emer Conatus, 26, também acredita derrubar tabus e preconceitos. Ele produz um podcast na plataforma Spotify que tem como público-alvo os mais atingidos pelo HIV: os negros.
De acordo com o boletim epidemiológico HIV/Aids de 2019, do Ministério da Saúde, no período de 2007 a junho de 2019, a maioria das novas infecções atingiu os negros, com 49,7%. Com o programa "Preto Positivo", Emer busca visibilidade a essa parcela que vive com HIV.
"Falar sobre o HIV e a Aids com recorte racial na TV é uma grande conquista. Mas vai além disso, é sobre visibilidade, quero que pessoas como eu acessem todos os lugares sem precisarem fazer silêncio", comenta.
O debate não apenas sobre o HIV, mas sobre o quadro evolutivo para Aids que aborda no programa tem relação com a própria vida de Emer. Diagnosticado às vésperas do Natal de 2018, o resultado do exame apontou para a Aids.
Ele logo buscou informações porque "não tinha tempo para pensar". Morando com a mãe, irmã e sobrinhas, precisava se manter ativo para levar o sustento para casa com a venda de água em semáforos de São Paulo.
"O lance é que eu não tinha tempo pra pensar. Morava com mãe, irmã e três sobrinhas pequenas. Todo mundo desempregado e as contas atrasadas. Não podia parar. O HIV não era a minha maior preocupação, eu precisava sobreviver a outras vulnerabilidades", diz.
Com a carga viral atualmente estabilizada, conta que o tratamento foi essencial para superar o quadro de Aids e continuar a vida de maneira saudável. "Comecei o tratamento assim que houve vaga. Não tive efeitos colaterais em relação aos antirretrovirais, porém como o meu caso era Aids, tomava também nos primeiros seis meses uma série de antibióticos, sendo um deles o azitromicina, que me enjoava um pouco, mas isso passou, hoje é de boa", comemora Emer, que atualmente é arte-educador na rede pública estadual e ator.
Sorofobia em família
A rigidez em seguir os protocolos médicos foi o que a psicóloga Victória Petrini, 26, aprendeu ao longo da vida. Ela vive com HIV desde que nasceu, após transmissão vertical da mãe nos anos 1990, época em que a medicina não estava avançada em relação à imunodeficiência na gestação.
Os efeitos colaterais no tratamento sempre estiveram entre os principais desafios, o que a forçou a suspendê-lo por seis meses após problemas de refluxo e diarreia. Por isso, Victória aderiu à medicina natural, o que a tornou detectável. Foi isso que a fez retornar com os remédios.
Ela agora acredita que, apesar de os remédios causarem efeitos, são as únicas alternativas medicinais para uma vida saudável e duradoura. A mãe dela, por exemplo, morreu devido a doenças oportunistas que se aproveitaram da baixa imunidade causada pelo HIV.
"Sem o medicamento, a gente vive bem melhor, mas com ele, vivemos mais. É algo que ajuda o vírus a não se manifestar, mas afeta quase todo o resto. Estou detectável, mas tomando o meu medicamento. Preciso fazer outro exame para saber como está agora a minha carga viral, mas a maior parte da minha vida fui indetectável", diz.
Apesar de conviver com o vírus desde o nascimento, Victória nunca tornou pública a sorologia da maneira como aconteceu na série. Os amigos, família e a empresa onde trabalha têm conhecimento do HIV, mas foi a primeira vez que a jovem falou da sua condição para tanta gente ao mesmo tempo.
Com o alcance da TV, agora ela tenta assimilar como será daqui em diante em razão da falta de informações em massa da população sobre o tema. "Tive um golpe de coragem e resolvi contar minha história para as pessoas que não me conhecem", frisa.
Com o depoimento nas telinhas, Victória espera mais conscientização para derrubar preconceitos, algo que sentiu na pele dentro de casa. "Tive uma base estrutural familiar sem informação. Fui criada pela minha avó após a morte da minha mãe quando eu tinha dez meses. Nos diálogos, não existia da parte dela informação de como eram os procedimentos. Era como se eu estivesse tomando uma vitamina para não ficar doente".
Ela teve a instrução que pôde, mas em relação ao HIV, não soube orientar. Desde criança tive uma imagem de que existia alguma coisa comigo, mas não entendia muito bem. Isso fazia passar por preconceito dentro da minha família. Era preconceito de não usar o mesmo talher, mesmo copo, de entrar na piscina e as outras pessoas saírem, algo bem diferente de hoje em dia.
Série "Deu Positivo"
A série estreou em 1º de dezembro, data que se celebra o Dia Mundial de Combate à Aids, na MTV. O projeto audiovisual, composto por três episódios, é uma produção da farmacêutica GSK/ViiV Healthcare ao lado dos coprodutores Vbrand e CineGroup.
O documentário tem como protagonistas cinco jovens que moram em São Paulo. Em três episódios, os participantes contam suas histórias reais permeando os temas indetectável = intransmissível, sorofobia e rede de afeto para levar informação à população.
As gravações da série respeitaram os protocolos de segurança de produções audiovisuais e autoridades de saúde por causa da pandemia da covid-19. A equipe e personagens fizeram testes clínicos e todos os exames apresentaram resultado negativo.
"Ao longo dos anos, a GSK/ViiV Healthcare tem desenvolvido diversas ações para desmistificar questões em torno do tema HIV, especialmente para jovens, entre os quais há um aumento do número de infecções. Com a série, mostramos através de histórias reais que é possível viver com HIV com qualidade de vida e não transmitir o vírus, desde que esteja em tratamento e com carga viral indetectável. Projetos como esse trazem à tona a importância do tema para o enfrentamento do HIV/Aids no país", comenta Gunnar Riediger, diretor da unidade de negócios BioTech da GSK Brasil.
"A MTV sempre destacou a importância e se manteve envolvida em ações de prevenção ao HIV e, mais do que isso, com foco no combate ao preconceito. Entrar como parceiro desse projeto reforça nosso compromisso em trazer esclarecimento e informação", afirma Tiago Worcman, vice-presidente sênior de Marcas de Música e Entretenimento da ViacomCBS América Latina, detentora da MTV no Brasil.
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