Se molhou em uma enchente? Veja quais cuidados tomar durante e depois
Há muitos rios escondidos sob camadas de asfalto. Apenas a cidade de São Paulo tem de 300 a 500 deles nessa situação, algo em torno de 3.000 quilômetros concretados. Com as chuvas, principalmente durante o verão, esses cursos d'água então aumentam de volume e tomam ruas e casas, arrasam cidades, tiram vidas e transportam muitas doenças, entre as quais cólera, hepatite A, febre tifoide e diarreias causadas por Escherichia coli e Salmonella.
Você saberia o que fazer durante e após cair em uma água contaminada dessa, misturada com lixo, sujeira e esgoto? De acordo com a Defesa Civil, em meio ao cenário descrito, a primeira coisa a se fazer é buscar um local seguro para evitar o contato prolongado com a inundação e se afastar de bueiros, córregos e fontes de energia.
Evite se deslocar até as águas baixarem e o caminho estiver seguro e só entre na área alagada se for inevitável, em extrema necessidade.
"O uso de calça comprida e sapato fechado ajuda, mas não protege totalmente, pois acabam encharcados. O mais indicado é o uso de galochas ou sacos plásticos para proteger a pele por dentro do calçado, se não houver como evitar o contato com a água e o barro", orienta Ilana Teruszkin Balassiano, doutora em ciências (microbiologia) pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e tecnologista em Saúde Pública da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).
Passado o susto, corra para se lavar
A transmissão de doenças ocorre principalmente pelo contato demorado da água ou do barro contaminado com a pele, mesmo que não haja feridas. Por isso, não espere o corpo secar naturalmente e, o quanto antes, lave bem com água e sabão pernas, pés e mãos, que estão mais expostos.
Você pode tentar cumprir esse cuidado até mesmo antes de chegar em casa. Basta ter acesso a água potável, ou a uma garrafa com água mineral e um sabonete.
Atenção redobrada também com as "portas de entrada", que facilitam ainda mais o contágio de agentes nocivos no corpo. O aviso serve tanto para ferimentos, como mucosas, que expostos à água contaminada podem levar pela corrente sanguínea perigos como a Leptospira, bactéria presente na urina do rato e que causa leptospirose, infecção aguda que é tratável quando diagnosticada cedo, mas com potencial para evoluir para formas graves e até matar.
"Com relação a cuidados genitais, assim que possível tome um bom banho. Se imergiu na inundação, é interessante fazer uma ducha íntima no chuveiro, sem nenhum produto químico, para higienizar a parte interna da vagina, no caso de mulheres sexualmente ativas. Meninas virgens, por terem a membrana himenal (hímen) intacta, têm uma proteção maior, por isso basta que lavem a parte externa com água e sabonete e observem se não haverá corrimento", orienta Alexandre Pupo, ginecologista e obstetra dos hospitais Sírio-Libanês e Albert Einstein (SP).
Quando procurar um médico?
Em caso de acidentes, com cortes e perfurações, ingestão de água, alterações respiratórias, oculares, gastrointestinais, ou cutâneas e dores que possam estar relacionadas com a exposição à enchente, é importante procurar uma unidade de saúde.
De acordo com os sinais e sintomas apresentados, o médico poderá indicar cuidados locais, medicamentos, hidratação oral, ou diretamente na veia, exames, tratamentos preventivos, vacinas e até internações.
"Se atingidos pela enchente, depois de lavados abundante e imediatamente, os olhos precisam ser observados e, ao menor sintoma, melhorar em até seis horas. Se estiverem doendo, sensibilizados, ou vermelhos é preciso procurar ajuda, pois podem ser lesões, ou inflamações de córnea e conjuntiva e que exigem tratamento sérios, com antibióticos e anti-inflamatórios fortes", explica Leonardo Nicioli, oftalmologista do Hospital Cema, em São Paulo.
Do mesmo hospital, o otorrinolaringologista Gustavo Mury faz outro alerta sobre contato com água suja.
"Como o nariz tem comunicação direta com a garganta, a água que entra pelas fossas nasais também pode ser deglutida, levando micro-organismos e substâncias tóxicas para o interior do organismo. Se isso acontecer é importante uma avaliação precoce, da mesma forma caso entre água de enchente nos ouvidos, pois as infecções são mais incidentes no canal auditivo".
Cuidado com o que sobrou
O risco de contaminação pode ocorrer pelo contato com a água e o barro de enchentes e deslizamentos, mas também durante a limpeza de uma casa ou carro atingidos. Dessa forma, é importante evitar tocar superfícies sem luvas, máscara ou pisar em local úmido sem galochas, pois ainda há um alto risco, e orientar as crianças para não brincar nesses ambientes.
Caixas d'água, água de torneiras e tubulações também devem ser checadas antes de serem utilizadas.
Bactérias são sensíveis aos desinfetantes de uso geral, principalmente aqueles à base de cloro, recomendados para higienizar casas, e à água sanitária, que pode ser empregada para lavar roupas atingidas pela enchente.
"Garrafas e potes de vidro, latas e embalagens a vácuo, tipo caixa de leite, podem ser reaproveitados, mas precisam estar lacrados, em perfeita condição, sem amassados, estufados ou ferrugens. Desinfete esses produtos com 2 colheres das de sopa de hipoclorito de sódio 2,5% para cada litro de água, ou passe álcool líquido a 70%", orienta Gabriela Cilla, gastróloga e nutricionista clínica, funcional e esportiva da Clínica NutriCilla.
Alimentos em situação de enchente podem causar diarreias, vômitos, febre e, em casos mais graves, levar a morte. A nutricionista indica então descartar perecíveis, como frutas, legumes, verduras e carnes, ou que estejam abertos, violados e com cheiro, cor e aspecto diferentes, umidade e mofo.
Alimentos submersos, em plásticos, ensacados e fora da geladeira por mais de duas horas, independente de alterações, ou de não terem sido abertos, não devem ser consumidos.
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