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Glifosato está na maioria dos alimentos; o que consumidor pode fazer?

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Imagem: alffoto/iStock

Giulia Granchi

Do VivaBem, em São Paulo

18/06/2021 04h00

O glifosato é o herbicida mais utilizado no mundo, embora haja diferentes regras entre os países sobre a quantidade da substância permitida. Entretanto, ele está relacionado a diversos riscos à saúde.

Em 2015, a OMS (Organização Mundial de Saúde) classificou-o como grau "A2", o que o coloca na categoria de "comprovadamente cancerígeno para animais mamíferos e provavelmente cancerígeno para seres humanos".

Conforme explica Rafael Rioja Arantes, nutricionista do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), a palavra "provavelmente" antes do termo "cancerígeno" é usada como argumento de defesa por alguns. "Considero uma desonestidade intelectual, já que nenhuma comissão de ética no mundo aceitará expor um humano diretamente ao glifosato para ver o quanto dá pra tomar antes de desenvolver câncer ou morrer. Não é possível e não é permitido, mas em animais e células humanas já foram constatados câncer ou mutações genéticas."

Há também indícios que ele esteja ligado ao risco de infertilidade, ao autismo, danos em células embrionárias e atue como um desregulador endócrino, segundo Larissa Bombardi, mestre e doutora em geografia pela USP (Universidade de São Paulo) e pesquisadora do uso de agrotóxicos na agricultura brasileira.

Presente em alimentos in natura e em ultraprocessados

Pelo uso em plantações, a presença de glifosato em alimentos frescos, in natura, como hortaliças e frutas (que ainda que não sofram aplicação direta, podem levar resquícios se a pulverização for área, por exemplo), costuma ser comum. Mas um estudo inédito do Idec, publicado no dia 1º de junho, aponta que, além dos alimentos naturais, ultraprocessados, como bebidas à base de soja, biscoitos de água e sal e bisnaguinhas, também podem ter traços do agrotóxico.

"Isso acontece porque as principais commodities agrícolas são a base dos ultraprocessados —soja, milho e trigo", diz Arantes, chamando atenção para o tempo que a substância fica no alimento: desde a colheita, passando para o envio para o processamento industrial, diferentes processos industriais, além do longo tempo na prateleira. "É mais de um ano desde a aplicação no campo e continua presente dentro do pacote, sendo efetivamente consumido pela população."

De acordo com ele, o monitoramento da própria Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) já identificou, pela análise de resíduos, quantidades maiores do que o permitido no país.

No Brasil, a lei permite que a contaminação da água por glifosato seja 5.000 vezes superior ao máximo que é permitido na água potável dos países da União Europeia. Para o feijão e a soja, a quantidade é 400 e 200 vezes superior, respectivamente. Os dados são do estudo "Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia", realizado por Larissa Bombardi no Laboratório de Geografia Agrária da USP. Os especialistas entrevistados ainda afirmam que a fiscalização não é forte e frequente o suficiente.

Existe quantidade segura de consumo de glifosato?

Quando se trata de exposição a agrotóxicos, os especialistas apontam que já não se fala em quantidade considerada segura. "Os camponeses, trabalhadores rurais ou quem vive próximo à área do uso intensivo, está, logicamente, mais exposto. Mas a realidade é que toda população tem contato com o glifosato. Em 2019, por exemplo, só o Mato Grosso consumiu 39 milhões de quilos de glifosato. Já os estados amazônicos do Pará, Tocantins, Acre e Roraima tiveram um aumento de 200% no consumo", indica a pesquisadora.

Um estudo realizado por pesquisadores das universidades de Princeton, FGV (Fundação Getulio Vargas) e Insper ainda mostrou que a disseminação do glifosato nas lavouras de soja levou a uma alta de 5% na mortalidade infantil em municípios do Sul e Centro-Oeste que recebem água de regiões sojicultoras. De acordo com os pesquisadores, isso representa um total de 503 mortes infantis a mais por ano associadas ao uso do glifosato na agricultura de soja.

O que consumidor pode fazer?

A principal alternativa da população é buscar uma produção orgânica e agroecológica. Por lei, os produtores que tem essa certificação —que pode ser conferida por selos — não podem utilizar agrotóxicos.

Embora esses alimentos sejam geralmente mais caros nos supermercados, é possível conseguir um preço mais baixo comprando diretamente com os produtores. O Idec criou uma lista de feiras orgânicas pelas cidades do Brasil.

Também vale lembrar que ultraprocessados não são recomendados para uma alimentação saudável e adequada. "São repletos de sal, gordura, açúcar e outros aditivos químicos que têm associação com o desenvolvimento de câncer, diabetes, obesidade, problemas circulatórios, entre outros", aponta Arantes.

"O problema é estrutural e precisa ser olhado dessa forma"

Para o nutricionista, a única solução é ter todo o caminho de produção e consumo de alimentos redesenhado. "Há caminhos para retirar os venenos da mesa dos brasileiros, mas isso precisa ser incentivado em níveis estruturais. Os orgânicos ainda não são acessíveis para a maior parte da população, mas com as condições certas, é possível expandir."

O acesso à informação e a consciência do que consumimos também é vista por Larissa Bombardi como um passo para a mudança. "Conforme as pessoas vão conhecendo esses processos, tenho expectativas que possamos mudar as estruturas."