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Meta 2025 do Unaids ataca transmissão mãe-filho e pede prevenção combinada

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Colaboração para VivaBem, em Maceió

10/11/2021 04h00

O Unaids (Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids) revisou as metas mundiais para direcionar as políticas públicas para controlar as infecções até 2025.

Não é a primeira vez que o Unaids faz uma meta ousada. A última previa que, até 2020, 90% das pessoas vivendo com HIV saberiam que têm o vírus; 90% delas receberiam terapia antirretroviral; e 90% estariam com supressão viral (ou seja, carga indetectável).

O relatório final do Ministério da Saúde apontou que, em 2020, o país não alcançou duas das três metas: das 920 mil pessoas viviam com HIV, 89% foram diagnosticadas, 77% estão fazendo tratamento com antirretroviral e 94% têm carga viral indetectável.

Agora, a Unaids incluiu outras três metas:

  • 95% das pessoas utilizando prevenção combinada;
  • 95% dos serviços buscando eliminar a transmissão vertical;
  • 95% das mulheres em idade fértil com acesso a serviços de orientação sexual, reprodução e sobre HIV.

Além delas, até 2025, a Unaids quer que os países alcancem as mesmas metas de 2020, com cinco pontos percentuais a mais, ou seja, que 95% das pessoas vivendo com HIV saibam do diagnóstico; destas, 95% estejam em tratamento; e destas 95% estejam com carga viral indetectável.

Essas metas abordam as desigualdades nas quais o HIV, covid-19 e outras pandemias prosperam e colocam as pessoas no centro, especialmente as pessoas em maior risco e marginalizadas. Winnie Byanyma, Diretor Executivo do Unaids

Metas são "bússola"

Segundo Veriano Terto Júnior, vice-presidente da Abiaids (Observatório Nacional de Políticas de Aids), as metas devem ser vistas como um caminho a ser seguido.

"A gente sempre olha essas metas não pelo ponto de vista de serem factíveis —porque elas são difíceis, especialmente para países pobres—, mas por elas serem uma bússola para indicar o caminho a ser seguido", diz.

Para Terto Júnior, elas devem servir para estimular um debate entre diferentes atores, principalmente no âmbito de governos. "O Brasil até conseguiu se aproximar da meta 90-90-90, mas hoje o número de casos tem subido, especialmente entre pessoas mais jovens. E isso é preocupante, porque demonstra que há falhas na prevenção", pontua.

Um dos pontos que ele fala que o Brasil precisa melhorar é na meta para prevenção combinada. "Não podemos ficar restritos apenas à camisinha como insumo. É preciso oferecer mais oportunidades aos usuários", explica.

Ele aponta que uma das opções que precisa ganhar mais adesão é a PrEP (Profilaxia Pré-Exposição), destinada a pessoas que têm mais situações de risco, além da PEP (Profilaxia Pós-Exposição ao HIV).

Mais pré-natal

A infectologista Vera Magalhães atuou por mais de 30 anos, abrindo inclusive o serviço especializado do Hospital das Clínicas da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco). Ela concorda que as metas do Unaids são difíceis de serem alcançadas porque as pessoas ainda têm receio em procurar serviços de testagem.

"A gente tem um programa exitoso no Brasil, mas ultimamente temos observado uma falta de procura das pessoas em fazer testes, mesmo existindo os serviços e o teste rápido. Há um preconceito da doença dos próprios pacientes infectados, acho que um pouco de receio mesmo", diz.

Mas o problema do HIV não é ser diagnosticado, mas, sim, deixar de ser. Como se sabe bem, hoje existem tanto drogas de prevenção, como de tratamento extremamente eficientes. Sou da era que não existia. Conduzi muito pacientes sem tratamento específico, e eram quadros muito dramáticos. Vi pessoas maravilhosas morrerem na minha frente porque só se tratavam as infecções oportunistas. Vera Magalhães, infectologista

Sobre a transmissão vertical, ela afirma que as novas metas acertam porque muitas mulheres não fazem pré-natal. "As que têm acesso, já na primeira vez fazem o teste do HIV. E daí em diante, na gestação, se fazem mais testes para acompanhar. A questão é o tratamento da mãe, a prevenção vertical passa por aí. Muitas mulheres só descobrem que são infectadas pelo HIV quando chegam para parir", conta.

Ela afirma que, mesmo só descobrindo a infecção próximo ao parto, ainda é possível traçar algumas estratégias para diminuir o risco de transmissão. "Isso ocorre com uma terapia antirretroviral. Mas o ideal é que isso seja descoberto no início da gestação, por isso é preciso fazer sempre o pré-natal", pontua.

Magalhães afirma que o atual governo praticamente abdicou de fazer campanhas educativas, o que tem um impacto direto entre os mais jovens. "Sinto que o que mais precisava ter eram campanhas. E nesse momento, especificamente, a gente tem muito pouca campanha para testar. A gente não ouve falar nem de covid, imagine das outras doenças. então isso dificulta alcançar essas metas porque as pessoas têm que ser sempre lembradas de que HIV, qualquer pessoa sexualmente ativa pode se infectar", completa

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Imagem: Thinkstock

Desigualdades precisam ser atacadas

Lícia Borges Pontes, infectologista e mestre em saúde pública pela UFC (Universidade Federal do Ceará), defende que um controle real das infecções só ocorrerá quando acabarem as desigualdades sociais.

"A infecção pelo HIV ainda é uma questão de saúde pública para o mundo. O Brasil tem uma política estruturada e muito bem embasada tecnicamente para tratar do assunto. Porém ainda temos muitas fragilidades relacionadas ao desenvolvimento social e a carência de investimentos nos programas de prevenção, diagnóstico precoce, tratamento e suporte às populações-chave", pontua.

Ela explica que o Brasil está no grupo dos 30 países do mundo responsáveis por 89% dos novos casos de infecção pelo HIV. "As estratégias da Unaids para atingir metas tão ambiciosas impactam diretamente o Brasil. A ideia é auxiliar no fortalecimento e complemento das ações no país" diz.

Só com a eliminação urgente das desigualdades econômicas, sociais, culturais e jurídicas podemos pensar em acabar com a Aids até 2030 no Brasil e no Mundo. Toda a estratégia proposta pela Unaids gira em torno do fim das desigualdades. Lícia Pontes, infectologista

Por fim, Pontes lembra que o Brasil é um país continental e extremamente diverso. "As dificuldades não são só biomédicas, mas principalmente sociais. As desigualdades potencializadas pelo estigma e discriminação continuam limitando o acesso das populações-chave e pessoas mais vulneráveis ao serviço público de saúde. Essas desigualdades estruturais limitam soluções comprovadas para a prevenção e o tratamento do HIV", explica.