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Por que ver muita TV faz mal? Problema não é apenas sedentarismo

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Imagem: iStock

Flávia Santucci

Colaboração para o VivaBem

01/08/2022 04h00

Quem assiste à televisão em excesso pode nem perceber, mas, muito provavelmente, está fazendo mal para a própria saúde. E não é só por conta do agravamento do sedentarismo, que pode levar à obesidade.

Em excesso, ver TV pode provocar irritabilidade e cansaço da visão, além de causar dores de cabeça em quem não costuma ter ou agravar em quem já sofre com o problema. O uso exagerado de telas ainda pode indicar traços de depressão.

No caso de jovens e crianças, ficar muito tempo vendo televisão pode até atrapalhar o desenvolvimento. "Todas as faixas etárias estão sujeitas ao risco da exposição excessiva às telas. Porém, existe uma grande preocupação com as crianças, especialmente as menores, cujos cérebros estão em franco desenvolvimento e dependem de atividades interativas, físicas e a relação com outras pessoas para o correto desenvolvimento de suas habilidades e intelecto", diz Marcelo Valadares, neurocirurgião do Hospital Israelita Albert Einstein.

"Muitas vezes, adolescentes passam até sete horas por dia, em média, em frente a telas. As principais preocupações giram em torno dos efeitos sobre o desenvolvimento do cérebro nos mais jovens, além da visão e do sono nas demais faixas etárias", diz Valadares, que também é pesquisador da disciplina de neurocirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).

Ele explica que estudos com uso de análises de ressonâncias magnéticas do cérebro já apontam diferenças no desenvolvimento de redes cerebrais de neurônios, especialmente as relacionadas à linguagem, em crianças pré-escolares excessivamente expostas a telas. "Isso poderia ser relacionado a atrasos na fala, por exemplo, embora as evidências sejam iniciais", diz.

Outras pesquisas, segundo o neurocirurgião, relacionam a TV a alterações do sono, em especial quando a pessoa está exposta a telas em períodos noturnos, por efeitos da luminosidade sobre o ritmo circadiano (nosso relógio biológico) controlado pelo cérebro.

E não é só a tela da televisão que pode ser prejudicial. De acordo com o neurocientista Fernando Gomes, do Hospital das Clínicas de São Paulo, até o volume do próprio aparelho pode afetar a saúde, de certa maneira. "Pode provocar alterações sensoriais e lesões que podem ser irreversíveis", diz.

TV como forma de fugir da realidade

Para Natália Harckbart, psicóloga da healthtech Telavita em Brasília, um ponto que deve ser levado em consideração quando se fala de consumo excessivo de telas é a saúde mental.

TV demais, ela explica, pode ser um indício de depressão. "Todo excesso tem de ser investigado de uma forma mais atenciosa. No caso da televisão em excesso, pode indicar uma 'fuga' da realidade."

Segundo Harckbart, a forma como nos habituamos a encarar as dificuldades apresentadas reflete em uma ausência da capacidade em lidarmos com os problemas de uma forma mais amadurecida e racional.

Diante de uma situação que nos causa desprazer, buscamos opções que podem nos proporcionar a fuga dessa realidade desprazerosa. Um exemplo é o excesso da TV.

Ainda segundo ela, sinais de depressão estão no exagero do tempo gasto nessa fuga da realidade, motivos que levam a pessoa a assistir demais à TV, conteúdos de maior interesse e o quanto ela leva para a sua realidade esse comportamento. "Seria possível observar na sua fala, por exemplo, um excesso de conteúdo relacionado ao mundo 'irreal' que a TV apresenta, deixando de falar sobre si mesma."

Quanto tempo o cérebro aguenta na frente da TV?

Segundo os especialistas, é difícil precisar quanto tempo cérebro e corpo aguentam em frente à televisão. Para Gomes, o bom senso deve pautar a discussão sobre o uso excessivo.

"Não é interessante a pessoa ficar períodos extremamente prolongados na frente da tela, sem levantar para ir ao banheiro, sem se alimentar ou então para realizar suas atividades de vida diária", diz o neurocientista. "Tendo em vista que vivemos em um mundo físico, é muito importante entender a importância que se tem de fazer atividades físicas e atividades intelectuais no decorrer do dia."

De acordo com Valadares, uma boa base é o que propõe a SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria). A recomendação é que crianças menores de 2 anos não sejam expostas a telas por nenhum período. Entre 2 e 5 anos, o limite recomendado é de uma hora por dia, sempre sob supervisão. Dos 6 aos 10 anos, duas horas por dia. Dos 10 aos 18 anos, três horas por dia.

Gomes ainda alerta sobre as perdas, que acabam acontecendo em cada fase da vida por conta do excesso de tempo gasto em frente à TV.
"Idosos, muitas vezes, vão perdendo o contato social com outras pessoas, que é extremamente importante, e o convívio social no mundo físico."

Adultos poderiam estar fazendo coisas que poderiam provocar um maior enriquecimento do seu cérebro, em termos de estimular a inteligência e ter experiências diferentes. "E a criança pode ficar comprometida por realizar apenas esse tipo de tarefa e, dessa maneira, sua própria psicomotricidade ficar alterada", diz o neurocientista.