'Silicone vazava do meu bumbum': bioplastia traz riscos e deixa sequelas
Em busca de um corpo mais bonito, a publicitária Simone de Almeida, 40, viveu seu pior pesadelo em uma clínica na cidade de Nova Iguaçu, no Rio de Janeiro, quatros anos atrás.
Ela queria aumentar os glúteos e optou pela técnica chamada bioplastia (modelagem corporal usando implantes biológicos ou sintéticos), que seria feita em um local considerado seguro e custava, na época, pouco mais de R$ 8 mil.
Durante o procedimento estético, ela conta que foi lesada e que os profissionais colocaram silicone industrial ao invés de PMMA (polimetilmetacrilato), material que também é contraindicado por cirurgiões plásticos e que oferece grandes riscos à saúde.
No dia da cirurgia, os médicos podiam colocar aproximadamente 180 ou 200 ml e, segundo Simone, foi inserido cerca de um litro. "Eu fui lesada. A clínica parecia confiável e muitas influenciadoras indicavam", relembra indignada.
As primeiras reações ao material começaram a aparecer e deixaram a publicitária assustada. Ela ainda foi aconselhada pelos enfermeiros da clínica fluminense a não contar para nenhum médico que havia feito uma bioplastia.
"Tive febre e passei mal. O silicone vazava do meu bumbum e pediam para colocar papelão com supercola [para segurar]", conta a VivaBem.
Poucas semanas após o procedimento a que Simone foi submetida, ela descobriu que a enfermeira responsável e outras pessoas da clínica foram presas por alguns dias. Mesmo parecendo perigoso, ela conta que não sabia dos riscos do produto anos atrás.
"Eu perguntei da Andressa Urach, por exemplo, e me falaram que ela tinha usado hidrogel. Não sabia dos riscos. Um médico que aplica isso só quer dinheiro."
Sequelas até hoje
Com diversas dores e efeitos colaterais, Simone conta que muitas pessoas a alertaram sobre um possível golpe em decorrência da bioplastia realizada. Morando na Argentina, ela foi atrás de um profissional especializado e começou a remoção da substância do organismo.
Atualmente, restam somente 400 ml em seu corpo, mas como a retirada é dolorosa, ela preferiu não fazer a retirada total.
No entanto, até hoje ela sofre com as sequelas do procedimento estético. "Fiz duas cirurgias. Ainda tenho vários sintomas, não consigo dirigir por muito tempo e tenho dores na lombar", diz. Sua saúde mental também ficou debilitada, já que sua autoestima se abalou e a decepção gerou grandes danos emocionais.
Para encorajar ainda mais pessoas e alertar sobre o perigo do silicone industrial, ela criou uma página no Instagram chamada "Vítimas da Bioplastia", que já conta com quase 170 mil seguidores, em que as pessoas relatam os efeitos das cirurgias malsucedidas.
No início, era só para falar de silicone industrial, mas começaram a aparecer diversas vítimas que sofriam com os efeitos do PMMA. "Comecei a dar voz a pessoas que estavam sofrendo e que nenhum médico queria colocar a mão", diz.
Como os efeitos colaterais são bem severos e, muitas vezes, o custo para remoção é mais alto do que a própria bioplastia, a brasileira tenta ajudar os pacientes e seguidores que chegam à página com consultas médicas, cirurgias e outras despesas financeiras.
Bigode chinês e frustração
A brasileira Simone não foi a única a sofrer com os efeitos da bioplastia. A paranaense Ylana Figueiredo, 32, esteticista, foi outra vítima do procedimento estético.
Seis anos atrás, ela queria fazer um preenchimento na região conhecida como bigode chinês, que começa no final do nariz e vai até os lábios. Como fazia sempre com ácido hialurônico, que precisa ser renovado após alguns meses, ela optou pela bioplastia, com a promessa de ter resultados definitivos. "Tinha consciência dos riscos, mas achei que era pouca quantidade", conta.
Ao realizar o procedimento no consultório, ela relembra que já saiu deformada. Pouco depois da técnica, o médico disse que ela iria desinchar, mas três meses depois não houve quase nenhuma mudança e a região ficava ainda mais inchada por causa do calor. Ela conta que ficou um pouco depressiva, mas que continuou seguindo com sua rotina.
Mesmo sendo vítima desse procedimento, a esteticista relata que sabia dos riscos. "Ao contrário das 90% das pessoas, eu sabia. Não fui enganada. Mas achei que seria pouca quantidade", afirma.
Para tentar melhorar seu rosto, ela começou a saga de diversas cirurgias para a retirada do PMMA. No entanto, era muito difícil encontrar um profissional que quisesse fazer o procedimento cirúrgico, devido à complexidade.
Somente na última cirurgia que ela, de fato, viu resultados expressivos. "Comecei a tirar depois de um ano que fiz. Fiz quatro cirurgias até agora e tenho que esperar um intervalo de quase um ano entre elas. Nesta última, o médico retirou quase 90% do polimetilmetacrilato", explica.
De cinco anos para cá, Ylana já gastou quase R$ 60 mil com todos os procedimentos cirúrgicos que fez para a retirada completa do material de seu rosto. Hoje, ela destaca que nunca mais faria e aconselha pessoas sobre os riscos envolvendo uma bioplastia.
"Não devem ir para o caminho mais fácil e nunca colocar um produto definitivo e incompatível", alerta.
O que é bioplastia e quais os riscos?
É um procedimento que usa substâncias com o intuito de preencher algumas regiões do corpo. Geralmente, é feito com polimetilmetacrilato, popularmente conhecido como PMMA.
Surgiu no final dos anos 80 e se propagou até a década de 90, principalmente para preenchimento do rosto de pacientes com HIV. Porém, teve seu uso indiscriminado ao longo de anos, por alguns médicos e até cirurgiões dentistas, o que é contraindicado pelas Sociedades Brasileira de Cirurgia Plástica e de Dermatologia.
Recentemente, a SBCP (Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica) condenou a prática e soltou um comunicado oficial alertando sobre substâncias usadas nesse tipo de procedimento por alguns profissionais de saúde.
A entidade não recomenda a aplicação do produto para fins estéticos e utilizado fora das recomendações do Conselho Federal de Medicina. Embora os médicos desaconselhem a prática, ainda não há uma proibição formal no país.
Como promete um "resultado" definitivo, pode gerar diversos problemas, sendo os mais comuns nódulos relacionados à aplicação e quantidade do produto.
"Com o decorrer do tempo, ele dá uma irritação muito ruim e, a longo prazo, forma fibroses [cicatrização interna da área submetida ao procedimento] muito intensas e que precisam ser retiradas", alerta José Octavio Gonçalves de Freitas, presidente da SBCP - regional São Paulo.
O uso do PMMA ainda pode resultar em inflamações tardias, aparecendo dez ou 15 anos após a primeira aplicação. Valéria Zanela Franzon, dermatologista e professora do curso de medicina da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná), ressalta que quem deseja usar preenchedores faça aplicação de ácido hialurônico ou outras substâncias recomendadas pelo dermatologista ou cirurgião plástico. "Hoje em dia há outras aprovadas pelo FDA e por órgãos do Brasil", diz.
A médica destaca ainda que nunca deve-se aplicar outras substâncias em regiões do corpo que já receberam o PMMA. "Como ele é buscado para trazer volume e usado para baixo custo, parecia ser uma coisa interessante no passado. Mas, hoje, não recomendamos mais. É importante identificar e comunicar seu médico."
Outro problema atribuído pelos especialistas é a durabilidade na pele. Assim como ocorreu com Ylana, são necessárias diversas cirurgias para a retirada do produto e, nem sempre, o material será extraído por completo.
"São raras as exceções que conseguimos retirar o PMMA, ainda mais quando ocorre ou está perto de áreas de risco", reforça Misia Martins, dermatologista e preceptora da residência médica em dermatologia no SUS (Sistema Único de Saúde) em Pernambuco.
"Diante da presença de outros materiais seguros, passíveis de remoção e dissolução, não faz sentido usar esse material. Quando uma pessoa aceita um implante desse tipo, ela precisa entender os riscos a que está submetida", conclui Martins.
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