Eles só descobriram câncer de próstata por insistência das esposas
Wagner Zerbinatti, 64, aposentado, descobriu há alguns anos que tem uma doença autoimune chamada polimiosite, e de lá para cá começou a cuidar mais da própria saúde. Mesmo assim, foi só após casar-se novamente, em 2021, e por insistência da esposa, que ele procurou um urologista.
"Com a descoberta de minha doença autoimune, há oito anos, passei a ir ao médico uma vez ao ano. A polimiosite é uma doença mais forte que a fibromialgia, e por complicações de uma tuberculose que não apresentou sintomas, perdi um dos pulmões. Inicialmente, os médicos tentaram retirar apenas metade deste pulmão, mas não resolveu e eu precisei de uma segunda cirurgia para retirada total do órgão", relembra o aposentado.
A polimiosite é uma doença inflamatória autoimune que compromete a musculatura. O impacto de um período de internação mais curto e com o paciente menos tempo de cama sempre é bastante favorável a uma melhor recuperação, sobretudo em quem tem comorbidades.
"Apesar de ter trabalhado mais de 30 anos na área de saúde ocupacional, dando palestras sobre Aids e câncer, depois de ficar viúvo acabei descuidando da saúde", diz Wagner.
O diagnóstico de câncer de próstata veio logo depois da visita ao urologista, e felizmente sua história tem um final feliz. Também por iniciativa da esposa, Wagner encontrou o médico que realizaria a cirurgia robótica recomendada para seu caso de associação do câncer com doença autoimune.
"Apesar de ser cuidadoso com a saúde desde 2014, e deste histórico de doença, o diagnóstico do câncer de próstata me deixou bastante abatido e preocupado com o futuro. Minha esposa é mais detalhista e tomou cuidados que eu não pensaria em tomar, como ler comentários sobre profissionais de saúde e procedimentos. Sem ela, talvez eu tivesse continuado com a primeira opção de tratamento, e não sei se teria tido o mesmo sucesso", recorda Wagner.
"Ela sugeriu que eu ouvisse uma segunda opinião, e assim cheguei ao procedimento cirúrgico que permitiu que em 20 dias eu retomasse minha vida sexual", continua o aposentado.
'Poderia estar ainda sem o diagnóstico'
O administrador João Batista Lopes Azevedo Junior, 38, também procurou o médico por insistência da esposa. Durante o pré-natal, Lívia, a esposa, tomou a iniciativa de pedir ao médico guias do convênio para o marido realizar exames de rastreamento.
"De acordo com os protocolos médicos, não tinha ainda idade para exame de toque ou ressonância magnética, e se não fosse a investigação profunda incentivada pela minha esposa, possivelmente estaria ainda sem o diagnóstico e o câncer poderia ter avançado de forma agressiva", lembra João.
Bruno Benigno, oncologista e um dos chefes da urologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (SP), comprova isso todos os dias nos agendamentos de consultas.
Segundo a percepção dele, 47% das consultas são agendadas por um terceiro (esposa, companheiro, filhos, amigos), sendo que 80% delas são feitas por mulheres, sejam elas as esposas, mães, filhas ou irmãs. Dos pacientes de Bruno, 86,3% são homens.
E para mulheres que muitas vezes têm jornada dupla e tripla, é bastante cansativo, já que cada pessoa deve ter autoconsciência da própria saúde e saber que cuidados são necessários.
Avanços da medicina e adoecimento em silêncio
O câncer de próstata é o mais incidente no homem, excluindo-se o câncer de pele não melanoma, e o segundo que mais mata, atrás do câncer de pulmão. De 2019 a 2021, foram mais de 47 mil óbitos em razão desse tipo de tumor. No ano passado, 16.055 homens morreram devido à doença, o que corresponde a cerca de 44 mortes por dia. Os dados são do Ministério da Saúde.
Os números mostram um ligeiro aumento da mortalidade por câncer de próstata em 2021 quando comparado aos dois anos anteriores. Ainda não se sabe se é um fato isolado ou reflexo de um aumento em decorrência da pandemia, quando muitos tratamentos e acompanhamentos acabaram sendo impactados.
A doença em estágio inicial, quando as chances de cura chegam a 90%, não apresenta sintomas. Quando eles aparecem, o tumor geralmente está em uma fase mais avançada, podendo o homem manifestar dificuldade para urinar, micção frequente, disfunção erétil, presença de sangue na urina ou no sêmen e dores pélvicas ou ósseas.
Segundo a SBU (Sociedade Brasileira de Urologia), os exames iniciais para detecção precoce do câncer de próstata compreendem a dosagem de PSA (antígeno prostático específico), através de exame de sangue, e o toque retal. A biópsia é solicitada quando o médico desconfia de que há algo errado ao analisar exames. Em 2020, foram registradas no Brasil 1.888 biópsias; em 2021, 34.673; e até agosto deste ano, mais de 27 mil.
O risco de câncer de próstata aumenta com a idade. Outros fatores de risco são histórico familiar de câncer de próstata em pai, irmão ou tio; ser homem negro ou obeso. As recomendações gerais para a prevenção são controle do tabagismo, atividade física e nutrição saudável, além de controle do peso e redução do uso do álcool.
Após os 75 anos, a SBU (Sociedade Brasileira de Urologia) recomenda que somente homens com perspectiva de vida maior do que dez anos façam avaliação da próstata através de exames. Essas orientações quanto à idade valem quando não houver sintomas. Se houver, a procura pelo urologista deve ser feita o mais breve possível.
Com maior conhecimento sobre o câncer de próstata, métodos melhores para identificar o risco de cada paciente e exames de imagem mais sofisticados, médicos conseguem tomar decisões mais acertadas de tratamento.
Muitos diagnósticos são feitos a partir de alterações na consistência dessa glândula, o que é percebido através do exame de toque. A radioterapia a cada dia fica mais precisa, e com isso muitos pacientes podem se beneficiar de um tratamento completo em menor número de sessões e com menor taxa de efeitos adversos.
Ao contrário do que a maioria dos homens pensa, nem todos os casos de câncer de próstata precisam ser operados. Após uma biópsia confirmando que existe câncer na próstata, os tumores são hoje classificados em cinco grandes grupos.
Para a maioria dos tumores 1 e alguns 2, o início do tratamento pode incluir somente uma vigilância controlada, que será feita pelo urologista com exames clínicos, laboratoriais e de imagem, sem que isso promova perda de tempo no tratamento ou menor chance de cura em caso de progressão da doença. A definição pelo protocolo de tratamento e acompanhamento é feita individualmente, conforme o caso do paciente.
"Avanços no campo da cirurgia minimamente invasiva como as plataformas robóticas, embora ainda pouco acessíveis, trazem menos complicações e uma recuperação mais rápida", explica o professor Markus Gifoni, oncologista clínico e professor da UFC (Universidade Federal do Ceará).
Medo quase unânime
Uma grande preocupação dos homens após o diagnóstico de um tumor na próstata é a disfunção erétil. Existem alterações da função sexual, mas a maioria dos pacientes operados tem sua função erétil preservada, embora possa levar alguns meses para obter-se essa recuperação.
A ejaculação, entretanto, fica permanentemente ausente. Existem vários critérios que podem antecipar uma maior chance de recuperar a função erétil e entre os mais importantes estão: idade mais jovem, tumores pequenos ao diagnóstico, presença de atividade sexual habitual antes do tratamento do tumor, ausência de comorbidades como diabetes, hipertensão arterial e tabagismo, além de cirurgião capacitado.
A cirurgia robótica é uma estratégia que melhora os índices de complicacões associadas à prostatectomia radical, procedimento para retirada completa da próstata. Estudos mostram menor necessidade de transfusão sanguínea durante este procedimento operatório, além de menores taxas de disfunção erétil e de incontinência urinária, com recuperação mais rápida do que no procedimento convencional.
Autonomia é a chave
"É fundamental ajudar meninos e adolescentes a entenderem que promover saúde e prevenir doenças é um papel que deve ser desempenhado por eles, pois este entendimento está ligado ao princípio da autonomia. Somente assim o próprio homem será capaz de cuidar de sua saúde ao longo da vida", diz o psicólogo Vicente Sarubbi Junior, professor do curso de medicina da UEMS (Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul).
Para Sarubbi Junior, homens costumam adoecer calados. "O homem prefere acreditar que é forte do que assumir que precisa de cuidados. Cuidar de si não é declarar fraqueza, pelo contrário, valorizar sua vida é o próprio significado de força."
O acesso à informação também é defendido pelo professor Gifoni. "A educação específica sobre saúde do homem com informações de qualidade, que promove a quebra de preconceitos e se traduz num melhor conhecimento da população, é fundamental. Quanto mais bem informadas as pessoas estiverem, maior vai ser a proporção de pessoas que adota as práticas preventivas e de cuidados com a saúde".
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