Tatuagem dá câncer e mais doenças? O que diz a ciência sobre riscos reais

Riscos da tatuagem voltaram à tona nas últimas semanas após um estudo sueco associar os desenhos ao desenvolvimento de linfoma, tipo raro de câncer que afeta o sistema linfático, de defesa do corpo humano.

Entretanto, os próprios pesquisadores, da Universidade de Lund, apontaram a necessidade de mais investigações para cravar essa relação.

Riscos concretos da tatuagem estão associados à falta de higiene durante o procedimento, como não usar materiais descartáveis e tintas regulamentadas. No Brasil, inclusive, só três marcas são liberadas pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

Tatuagem causa linfoma?

O estudo indicou risco 21% maior de pessoas tatuadas terem linfoma. O alerta é maior na faixa até dois anos após o procedimento, ou depois de 11 anos da tatuagem. A pesquisa, publicada no periódico The Lancet no dia 21 de maio, acompanhou todos os casos de linfomas malignos diagnosticados na Suécia em pessoas de 20 a 60 anos, entre 2007 e 2017.

Há uma explicação biológica para isso: as tatuagens causariam um processo inflamatório crônico. A inflamação ocorre quando o organismo detecta corpos estranhos. O "exército" de células de defesa é ativado para combatê-los, mas, quando o processo é crônico, cresce o risco de mutações nas células, causando câncer.

Além disso, a tinta usada na tatuagem pode ter substâncias tóxicas. Quando aplicada, ela penetra até à camada mais profunda da pele (a derme) para depois atingir a circulação, podendo chegar aos linfonodos (ínguas, gânglios ou caroços, onde ficam concentradas as células do sistema linfático) e causar alterações. O estudo confirmou a presença das tintas nas estruturas.

No entanto, isso não é suficiente para afirmar que tatuagem causa linfoma. "Não é cabível fornecer nenhuma recomendação sobre tatuagens e saúde com base nesse único estudo", disse Christel Nielsen, uma das autoras do estudo, ao site The Conversation. Ela afirmou que já desenvolve junto a colegas pesquisas sobre a relação da tatuagem com câncer de pele e doenças autoimunes (como problemas da tireoide e sarcoidose).

"Avaliar fator de risco para determinada doença é muito difícil, porque há variáveis envolvidas na vida daquela pessoa", diz Talita Silveira, onco-hematologista do A.C.Camargo Cancer Center (SP). "É preciso entender que na vida a gente assume riscos à saúde, assim como comer ou não ultraprocessados. Você tem que fazer escolhas durante todo o tempo."

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O estudo é um alerta. Tem uma lógica biológica, mas ele mesmo conclui que não consegue estabelecer uma relação de causa-efeito. É diferente de poder afirmar, por exemplo, que cigarro aumenta o risco de câncer de pulmão. Talita Silveira, onco-hematologista

Achados do estudo também indicaram:

Não haver relação com o tamanho da tatuagem. Mesmo que os pesquisadores apontem incidência maior entre quem tem desenhos menores do que a palma da mão;

A análise sugeriu risco maior em quem tinha tatuagens pretas/cinzas do que em pessoas com desenhos coloridos;

O risco é maior para quem fez remoção a laser.

Equipe prepara mais estudos sobre os possíveis impactos da tatuagem à saúde
Equipe prepara mais estudos sobre os possíveis impactos da tatuagem à saúde Imagem: Reprodução/Unsplash
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Tatuagem x câncer de pele

Não há evidências de que tatuagens causem ou aumentem o risco de câncer de pele. Porém, podem dificultar a identificação precoce das lesões suspeitas, principalmente desenhos que cobrem essas manchas. Isso preocupa, porque o rastreio no início aumenta as chances de sucesso no tratamento.

Fazer tatuagens em cicatrizes de um câncer de pele também não é indiciado. Como existe o risco de o tumor voltar nas bordas, é importante que a lesão esteja exposta e qualquer alteração fique evidente já nos primeiros sinais.

Alergias são um dos principais riscos?

Alergias são uma das reações mais comuns após fazer tatuagens. O processo ocorre em resposta a componentes químicos da tinta —geralmente, substâncias a que a pessoa já tinha histórico alérgico. Os principais sinais são:

  • Vermelhidão na pele;
  • Sensação de a pele estar mais grossa;
  • Descamação.
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"Às vezes, a alergia ocorre contra um determinado tipo de pigmento. Então, se a tatuagem tem várias cores diferentes, podemos ver a reação apenas em algumas áreas nas quais foram utilizadas a tinta que a pessoa desenvolveu alergia", explica o dermatologista Denis Miyashiro, da SBD (Sociedade Brasileira de Dermatologia).

Alerta contra as infecções

Siga as orientações do tatuador de como higienizar a região tatuada e quando retirar os curativos
Siga as orientações do tatuador de como higienizar a região tatuada e quando retirar os curativos Imagem: Reprodução/Unsplash

Infecções acontecem quando a tatuagem é feita sem as orientações de higiene adequadas. "Nessas situações, há a penetração de microrganismos na pele, levando ao inchaço, vermelhidão, dor e calor local", diz Miyashiro.

Podem existir infecções pelos vírus da hepatite e HIV, além de fungos e bactérias, por exemplo. Agulhas descartáveis diminuíram os casos, mas também é necessário usar porções individuais de tintas, descartadas a cada cliente. Isso porque a agulha pode transmitir o vírus para a tinta.

A complicação mais séria é a infecção. Se sentir dor intensa, se a área tatuada começar a inchar ou observar saída de secreção, deve-se sempre procurar atendimento médico. Se não diagnosticadas e tratadas rapidamente, as infecções podem levar a quadros graves. Denis Miyashiro, dermatologista

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No que prestar atenção ao tatuar?

Existem apenas três marcas de tintas registradas pela Anvisa. Outros produtos são clandestinos, pois não garantem a ausência de substâncias tóxicas ou carcinogênicas (que causam câncer).

A Anvisa orienta sempre perguntar ao tatuador qual tinta é usada (incluindo observar a data de validade). As regulamentadas têm um número de registro no rótulo e são das marcas:

  • Starbrite Colors - Amazon Indústria, Comércio, Exportação e Importação de Produtos Especializados;
  • Electric Ink - Electric Ink Indústria Comércio, Importação e Exportação LTDA;
  • Iron Works - Brasil LTDA.

Se o produto for clandestino, a indicação é notificar a vigilância sanitária local ou a Anvisa (pelo número 0800 642 9782).

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Mais orientações da agência indicam quais cuidados observar na hora de tatuar:

Luvas, agulhas, lâminas e outros dispositivos destinados a raspar pelos devem ser descartáveis;

O tatuador deve lavar as mãos antes e depois dos procedimentos;

Ao fazer a tatuagem, o profissional deverá usar luvas e máscaras descartáveis de uso único. É recomendável ainda o uso de proteção nos cabelos, avental e protetor ocular;

As agulhas finais de tatuagem (agulha+haste) deverão, depois de montadas, ser esterilizadas em embalagens individuais e abertas à vista do cliente;

É proibida ao profissional a prescrição e administração de quaisquer medicamentos (anestésicos, antibióticos, anti-inflamatórios e outros) por qualquer via de administração (tópica, oral, injetáveis e outras) aos clientes;

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As tintas devem ser fracionadas para cada cliente, devendo ser descartadas as sobras.

Tatuador deve usar objetos descartáveis e, inclusive, porções individuais de tinta
Tatuador deve usar objetos descartáveis e, inclusive, porções individuais de tinta Imagem: Reprodução/Unsplash

Cuidados após a tatuagem

Tatuagem é uma ferida. Por isso, a boa cicatrização é essencial, inclusive para afastar riscos de infecção. O tatuador deve orientar quando retirar os curativos e como fazer a higienização correta.

Não é recomendado:

  • Tirar as casquinhas formadas na região;
  • Exposição solar direta;
  • Coçar a região;
  • Usar roupas justas, que geram atrito à região.
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Referências: Anvisa; Biblioteca Virtual do Ministério da Saúde; Secretaria de Saúde de São Paulo.

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