Conheça sete histórias incríveis de atletas das Paralimpíadas de Tóquio
Claro que histórias não faltam, das mais extraordinárias, contadas pelos atletas que chegam à elite de Olimpíadas e Paralimpíadas. O Comitê Organizador dos Jogos de Tóquio-2020 mantém várias delas em seu site oficial e algumas dos paralímpicos são bem curiosas.
Escalar o Monte Kilimanjaro, na África? Ok. De cadeira de rodas, quando se treina ao nível do mar no sul da Inglaterra? Não deu, mesmo com uma adaptada. O britânico Aaron Phipps, do rúgbi em cadeira de rodas (classe 3.5, de maior motricidade), viu que não daria certo quando chegou à Tanzânia. Pensava que levaria três horas para alcançar o primeiro acampamento no dia 1, mas levou mais que o dobro. No dia 2, mais dez horas e meia até o acampamento, quando deveriam ser cinco.
Quando disseram "vamos carregá-lo", Aaron, 38 anos, corrigiu: "Não, não vão". E foi rastejando em mãos e joelhos — sofreu lesões, mesmo com luvas e joelheiras especiais — por dez quilômetros em cada um dos quatro dias. Mas alcançou o topo da montanha de 5.895 metros. "Fiquei aliviado por ter chegado e mandei um whatsapp para casa", disse (!). O que mais? Ah, que "é uma loucura estar no cume da montanha e com um sinal de celular tão bom".
Amputado das pernas e alguns dedos por causa de uma meningite aos 15 anos, Aaron aproveitou a escalada para arrecadar dinheiro para a Meningitis Research Foundation.
No goalball da Bélgica, são três irmãos na seleção. Mas Arne, Bruno e Tom Vanhove ainda têm mais três "em casa". Eles são... sêxtuplos. Nasceram na cidade de Bruges em 17 agosto de 1983, e, claro, começaram a chamar atenção da imprensa esportiva em seu país. Bruno foi a Pequim-2008, Tom chegou à seleção em Londres-2012 e Arne se animou a consolidar a "tomada" de meio time, literalmente, em Tóquio-2020.
Bruno é da classe B3 (consegue definir imagens), Arne e Tom da B2 (percepção de vultos), mas no goalball todos competem vendados.
De criança, os seis irmãos (três não têm deficiência visual) nem precisavam contar com muitos amiguinhos para brincar no jardim - naturalmente jogando juntos, também naturalmente três chegaram à seleção de goalbal. E agora Tóquio-2020, perto de completarem 28 anos. Bruno não acha nada demais serem sêxtuplos, mas estar nas Paralimpíadas sim, "porque é uma conquista, da qual nos orgulhamos".
A australiana Eiiza Ault-Connel participou das Paralimpíadas de Atenas-2004, parou com o esporte, teve três crianças (agora com 13, 11 e 8 anos de idade). Voltou depois de 17 anos. Disse que assistir aos Jogos do Rio-2016 atiçou novamente seus instintos de competição — mas também contou com um empurrão das duas filhas e do filho, que segundo ela achavam "legal" ver a mãe correndo em cadeira de rodas.
Aos 39 anos, a atleta da classe T54 (deficiência nos membros inferiores) disputa provas de 100m, 400m e maratona, porque decidiu provar que mulheres podem aliar o sonho de constituir família e competir no nível de elite, sem se sentirem culpadas. "Eu tinha caído nessa armadilha", comentou.
O improviso para treinar durante a pandemia levou Aled Davies, do arremesso do peso, a construir uma gaiola no quintal de casa em Cardiff, no País de Gales. Se o brasileiro Darlan Romani chamou o pedreiro para o serviço no terreno baldio ao lado de sua casa, o cadeirante britânico se virou por ele mesmo. Aproveitou árvores (macieiras e pereiras), construiu um círculo no chão que pavimentou com pisos usados em estábulos de cavalos e cercados com uma rede para cargas de caminhão reforçada com arames. "Foi um pesadelo", definiu.
A família tinha mudado um mês antes do lockdown pela pandemia e ver o arremessador da classe F63 (com prótese nos membros inferiores) girando e gritando no campo deixou os vizinhos um tanto preocupados.
Holandesa, Megan Hollander contou o que leva em um pingente pendurado no pescoço à quadra de badminton: as cinzas de sua mãe. A atleta da classe SU5 (deficiência em membros superiores) levou um baque com a perda, em 2018. Abandonou o esporte. Voltou. Contou que, com a pandemia e o Centro Nacional de Treinamento fechado, disse a si mesma: "Está tudo bem. Estou desistindo".
Mas voltou, agora aos 23 anos. Disse que foi com a mãe ao lado que conquistou bronze no Mundial da Inglaterra em 2015, poucos meses depois de conhecer o esporte, e por isso queria estar com ela em quadra em Tóquio-2020. "É uma jornada que comecei com minha mãe e poder estar aqui, para ela, é um grande objetivo. É algo pelo qual tenho vivido".
Provocando o presidente
Outro do rúgbi em cadeira de rodas (classe 3.0, penúltima de maior motricidade), Kory Puderbaugh, 25 anos — nascido na Polônia, foi levado de um orfanato para os Estados Unidos aos 5. Adotado por duas famílias, tem lembranças de alguém que poderia ser a mãe. Naturalizado norte-americano, é piloto de aeronaves e além do esporte de combate também joga xadrez. Ele tem uma história para contar, da visita ao presidente Barack Obama, na Casa Branca.
Era 2016 e ele não tinha nem um ano de seleção. Quando Obama se sentou a seu lado, Kory perguntou: "E quando você vai recuperar sua barriga de tanquinho?" (em inglês, six-pack abs, referência a seis músculos abdominais). O presidente, bem-humorado, respondeu: "Ainda estou trabalhando em quatro...".
Sobre a Casa Branca, achou menos espaçosa do que imaginava, com muitos banheiros... e sem acesso para cadeirantes: não havia elevador com acesso para cadeira de rodas e tiveram de subir pelo elevador da cozinha.
Natasha Baker sofre com uma lesão espinhal que a impossibilita de usar as pernas, mas pratica um esporte em que precisaria delas. É com toques que cavaleiros e amazonas costumam comandar seus cavalos, no paraadestramento. Mas a britânica de 31 anos, da classe GII (cadeirantes ou andantes com boa funcionalidade nos braços), usa a voz. Aliás, sussurros. Ela se diz "praticamente inutilizada" do quadril para baixo e, por isso, usa ruídos, palavras e sons - em Tóquio-2020 esteve com "Lottie".
"Fico sentada em um animal de três quartos de tonelada, que tem seus próprios sentimentos e pensamentos. Se ele ficar com medo de algo, posso voar dali", afirma.
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