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Após treta na China, marcas tentam se livrar do poder dos influencers
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Uma das (grandes) vantagens de se estudar o avançado mercado de tecnologia da China é antever inovações e modelos de negócio que devem se tornar populares em outras regiões do mundo, conforme novas tecnologias se espraiem por mercados menos maduros, como é o brasileiro. Foi assim, por exemplo, com a ascensão dos pagamentos digitais e com o uso de inteligência artificial para analisar o comportamento de consumidores: aconteceu lá e, depois, se popularizou pelo mundo todo.
Uma das tendências em frenética ascensão na China, já devidamente experimentada e copiada por serviços de venda online no mundo todo, é o live commerce, modelo de negócios em que um apresentador exibe produtos e serviços enquanto "entretém" seu público e, claro, o convence a consumir online.
Dados da Consultoria iResearch estimam que, este ano, o live commerce chinês feche o período anotando vendas superiores a US$ 130 bilhões. Isto equivale a mais ou menos oito vezes tudo o que o e-commerce do Brasil comercializa em um ano.
Mais do que isso, o número representa uma expansão de 100% sobre as vendas registradas em 2020. Diversas consultorias convergem para o fato de que, em 2022, mais de 20% de todas as vendas digitais da China ocorram durante lives.
Os exemplos de sucesso são muitos. Via live, vende-se na China carros, apartamentos, cosméticos e até foguetes espaciais.
O "pulo do gato" está na relação intimista e de confiança que se dá entre o público e os "lives streamers". Eles são especialistas no que oferecem, têm um histórico de só apresentar "ofertas que valem a pena" e são atenciosos com os consumidores, esclarecendo suas dúvidas e dando dicas sobre como tirar melhor proveito do produto que compararam.
Segmentos como eletrônicos (em que é preciso conhecer bem as specs de cada gadget) e cosméticos (em que há mil tipos de sombras e efeitos para cada tipo de pele e público) são ótimos exemplos de como a "venda consultiva" de um live streamer é útil para os consumidores.
No último mês, porém, uma briga pública entre a marca francesa L'Oréal e dois dos mais célebres influenciadores chineses, Li Jiaqui, um garoto conhecido como "o rei dos batons" e Viya, uma jovem conhecida pelo modesto apelido de "rainha das lives", apontou o que pode ser uma tendência no setor: o gradual divórcio entre marcas e influenciadores.
Ao caso: os dois jovens streamers divulgaram, com grande destaque, novas máscaras hidratantes da fabricante francesa. Ao estilo "na minha mão é mais barato", os influencers explicaram que a inovadora máscara facial fazia sua première com eles por preços promocionais.
Mas era mentira: dias depois dos influs anunciarem —e venderem milhões de máscaras— estas estrearam no mercado com preços ainda menores. O rei do batom e a rainha das lives, é claro, ficaram furiosos. Sua audiência, idem.
O drama por trás deste imbróglio é que não se trata de um conflito pontual.
Marcas e influs estão há tempos se estranhando na China. O motivo, é claro, é um só: dinheiro.
Como os influenciadores vendem bem e se tornaram estratégicos para o lançamento das grandes marcas, eles dão as cartas como querem. Pedem comissões e, evidentemente, barganham os melhores preços para seu público. Ter a melhor oferta é moeda essencial de um influenciador no mundo do live commerce.
As marcas já perceberam que suas margens andam apertando e que depender de jovens celebridades, eventualmente gananciosas e emocionalmente instáveis, pode não ser um caminho muito promissor.
Mais do que isso, inteligentemente, os influs concentram o tráfego de vendas em seus canais, ao invés de direcionar o consumidor para o app do fabricante ou vendedor.
Segundo a iResearch, na China, 30% das lives são agora feitas por "streamers corporativos", ou seja, alguém que é funcionário da marca e não um influencer terceiro. Este percentual deve crescer para 50% até o fim de 2023, prevê o estudo.
Há até o caso —cada vez mais comuns— de streamers "não reais", ou seja, um avatar digital.
Se a China sinaliza, de fato, tendências para o futuro do varejo no mundo, este pode ser um bom indicador: as marcas estão trabalhando para se libertar da "influência dos influencers", o que em si não é exatamente uma notícia boa.
Ao final de tudo, o futuro aponta para um modelo de negócios em que todas as etapas —até as interações humanas— são feitas de forma automatizada, por algoritmos que pertencem às megacorporações, fechando quaisquer possibilidades de renda (e vida?) fora delas.
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