Mal súbito provoca dor no peito e falta de ar; socorro rápido é essencial
Resumo da notícia
- A morte súbita, genericamente conhecida como mal súbito, é uma parada cardíaca
- Ela acontece de repente, até uma hora os primeiros sintomas ou 24 horas depois da última vez que a pessoa foi vista no exercício de suas atividades
- Em 80% dos casos, o mal súbito está relaciona a doenças cardiológicas, como obstrução das artérias, e neurológicas, como convulsões e AVC
- Consumo de drogas e doenças metabólicas, como diabetes, também geram o problema
- A prevenção se dá pela adoção de hábitos de vida saudáveis, que reduzem o risco para doenças cardiovasculares
"Os homens temem a morte como as crianças temem o escuro; e assim como o temor natural das crianças aumenta com histórias, o mesmo ocorre com o outro temor". Essa frase, de autoria do filósofo inglês Francis Bacon, ilustra bem a comoção que o mal súbito (ou morte súbita) pode causar. Inesperado, o problema faz da morte um evento ainda mais assustador.
O mal súbito nada mais é do que uma parada cardíaca (e pode ter diferentes causas). Ele é definido pela literatura médica como aquele quadro que acontece de repente, até uma hora dos primeiros sintomas ou 24 horas depois da última vez que a pessoa foi vista no exercício de suas atividades normais. Alguns indivíduos morrem instantaneamente; outros falecem após a manifestação de alguns sinais. Porém, dependendo do caso e quando o paciente é socorrido rapidamente, pode se salvar.
Os primeiros registros históricos foram encontrados no Egito e contam 4.000 anos, e se atribui a Hipócrates, o pai da medicina moderna, a primeira descrição de fator de risco para tal problema (a obesidade). A cada ano, ocorrem 17 milhões de óbitos por causas cardiovasculares em todo o mundo, e cerca de 4 milhões deles foram por morte súbita. Os dados são da OMS (Organização Mundial da Saúde).
Por que o mal súbito acontece?
Em 80% dos casos, a morte súbita está relacionada a doenças cardiológicas, seguidas de doenças neurológicas como o acidente vascular cerebral (AVC) e a crise convulsiva aguda. Doenças herdadas e fatores genéticos também podem estar relacionados.
O mecanismo desse evento é o resultado de um distúrbio elétrico do coração (arritmia) que interrompe a função de bombeamento e, consequentemente, do fluxo sanguíneo para o corpo.
Causas cardiológicas mais comuns
Obstrução das artérias do coração: doença aterosclerótica coronariana, como a isquemia miocárdica e o infarto, especialmente após os 35-40 anos.
Doenças do músculo cardíaco: cardiopatia hipertrófica —doença genética em que o coração fica hipertrofiado, ou seja, aumenta sua espessura. Isso gera desarranjo muscular que propicia o surgimento de arritmias graves, especialmente durante a prática de atividade física. Geralmente acomete pacientes jovens, ou seja, abaixo dos 35 anos.
Distúrbios elétricos do coração: arritmias, o que inclui doenças dos canais iônicos, também chamadas de doenças de canais moleculares, que levam a anormalidades no funcionamento desses canais por onde passam esses íons (potássio e magnésio) - que tornam esses indivíduos mais vulneráveis às arritmias.
Causas neurológicas mais comuns
Crise convulsiva aguda: pode estar relacionada a doenças como a meningite e a epilepsia, ou mesmo um sangramento.
AVC hemorrágico: lesão do tecido cerebral provocado por uma hemorragia no interior do crânio.
AVC isquêmico: perda de fluxo transitório (ou permanente) na região cerebral, devido ao bloqueio do fornecimento de sangue e oxigênio. "Importante lembrar que o AVC está relacionado à arterosclerose. Assim como ocorre nos eventos cardiológicos, a depender da extensão da área cerebral infartada e da idade da pessoa, poderá ocorrer a morte súbita", destaca Carlos Alexandre Twardowschy, chefe da residência em neurologia da Faculdade de Medicina da PUCPR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná).
Outras causas de morte súbita
- Consumo de drogas
- Doenças metabólicas, como o diabetes.
Quem está mais suscetível
Homens na faixa dos 60-70 anos estão sob maior risco. Nessa fase da vida, 60% dos casos estão relacionados à doença arterial coronariana (obstrução das artérias do coração). Apesar disso, é importante saber que, na população em geral, a morte súbita pode ser o "primeiro (e último) sintoma" de um problema cardíaco.
O evento pode acontecer na infância, mas é raro. Na juventude, geralmente se manifestará durante a prática de alguma atividade esportiva.
Os grupos a seguir precisam ficar ainda mais atentos:
- Pessoas que têm na família histórico de infarto ou doença genética do coração;
- Pessoas que tiveram um infarto recentemente;
- Pessoas com insuficiência cardíaca.
Como reconhecer os sintomas
A morte súbita é o estágio final de uma série de situações que levam à parada cardíaca. Ela pode ser precedida dos seguintes sinais:
- Dor no peito
- Falta de ar
- Fraqueza
- Tonturas
- Palpitações
- Desmaio
- Paralisia do rosto e da perna num dos lados do corpo (sinal de AVC)
- Dificuldade para falar ou compreender a linguagem (sinal de AVC)
- Perda ou obscurecimento da visão -- em um olho só (sinal de AVC)
- Perda do equilíbrio ou coordenação (sinal de AVC)
- Dor de cabeça intensa (sinal de AVC)
É possível uma "recuperação" após esse evento?
Quanto mais rápido for o socorro, mais chances de sucesso. A depender da causa e do tempo decorrido até o início do atendimento e sua qualidade, as manobras de ressuscitação cardiopulmonar podem ser bem-sucedidas, evitando a morte ou sequelas.
Fátima Dumas Cintra, professora livre-docente de cardiologia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), fala que tais sequelas geralmente são neurológicas. "Do ponto de vista cardíaco, trata-se de um problema elétrico. Se ele for revertido, o coração, que é um músculo, volta a funcionar", diz. Mas se uma pessoa tem uma arritmia grave, a ponto de perder a consciência, é possível prevenir novo evento usando um CDI (Cardioversor Desfribilidor Implantável), aparelho que fica alocado no tecido subcutâneo.
A cada minuto passado sem o devido socorro, a chance de recuperação diminui em 7% a 10%. A morte cerebral ou permanente ocorre no período de quatro a seis minutos após a parada cardíaca. Após 10 minutos, poucas tentativas de ressuscitação serão bem-sucedidas.
O que você pode fazer nessas horas?
Todos deveriam estar preparados para um evento como esse, porque a morte súbita pode ocorrer em qualquer lugar —desde um supermercado ou parque até em um encontro familiar. Por isso, fique atento ao passo a passo do socorro possível:
- Mantenha a calma ao ver pessoal tendo o mal súbito;
- Peça para alguém acionar imediatamente o serviço do SAMU (192);
- Ordene que alguém busque um desfibrilador (aparelho que libera uma descarga elétrica que faz o coração voltar ao normal. Ele funciona como um reset, isto é, "reinicia" o coração);
- Enquanto o desfibrilador não chega, inicie as compressões torácicas (massagem cardíaca), comprimindo forte e rapidamente. Isso garante a circulação do sangue e mantém a pessoa viva até a chegada do desfibrilador;
- Quando o desfibrilador chegar, utilize o aparelho conforme as instruções de uso, até o SAMU chegar.
Por que a morte súbita também pode acometer atletas?
A explicação para isso é que esses indivíduos são submetidos a alta exigência física. Além disso, o uso indiscriminado de substâncias para ganho de massa muscular e melhora da performance (anabolizantes, termogênicos etc.) podem aumentar o risco para esses eventos —veja aqui os perigos dos anabolizantes para a saúde.
Em esportistas adolescentes e adultos jovens, algumas doenças genéticas associadas a problemas cardíacos (cardiopatia hipertrófica ou displasia arritmogênica do ventrículo direito, por exemplo) podem se manifestar. Já nos atletas de meia-idade ou mais idosos, a morte súbita ocorre mais comumente como consequência de doença aterosclerótica. "A avaliação médica cardiológica periódica pode identificar essas e outras situações, prevenindo a morte súbita. A depender do risco, o atleta pode ter de encerrar sua carreira esportiva precocemente", explica Rafael Borsoi, cardiologista do Hospital das Clínicas da UFPR (Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Paraná).
Entenda a diferença entre síncope e morte súbita
"A síncope é a perda súbita da consciência associada à perda do tônus postural [a pessoa cai], seguida de recuperação espontânea. Esse quadro é mais conhecido como desmaio", define Leonardo Pippa Gadioli, médico assistente do Centro de Cardiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo).
Na morte súbita a recuperação não é espontânea. A pessoa poderá até se recuperar, mas, para isso, precisará de uma intervenção médica. Caso essa ação seja bem-sucedida, o evento é chamado de morte súbita abortada.
Dá para prevenir?
Nas doenças neurológicas, que têm como fator de risco a idade avançada, a prevenção não é possível. Contudo, como o AVC também se relaciona com a arterosclerose e a hipertensão, a estratégia é colocar em prática os cuidados que garantem um estilo de vida saudável e previnem doenças cardiovasculares. Confira:
- Procure um médico todas as vezes que observar algum sintoma diferente. Eles podem ser um sinal de alerta e deve ser valorizado;
- Pratique atividade física ao menos 3 vezes na semana;
- Invista em uma alimentação rica em frutas, verduras, grãos, proteínas de qualidade;
- Capriche na hidratação;
- Evite alimentos ricos em gorduras, açúcares e sal;
- Controle os níveis de colesterol e doenças como hipertensão e diabetes;
- Livre-se do tabagismo;
- Adote medidas para reduzir os níveis de estresse psicossocial
- Invista em estratégias para dormir bem
- Reduza a obesidade visceral (gordura abdominal);
- Invista em um check-up cardiológico e acompanhamento com um cardiologista. A medida ajuda a prevenir doenças que podem ser silenciosas e levar ao mal súbito.
Fontes: Fátima Dumas Cintra, professora Livre Docente em Cardiologia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), e membro da diretoria da Sobrac (Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas); Rafael Borsoi, cardiologista do HCFMUFPR (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Paraná) e professor da mesma instituição; Leonardo Pippa Gadioli, médico assistente do Centro de Cardiologia do HCFMRPUSP (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo), doutor em Ciências Médicas e professor do Curso de Medicina da Unaerp (Universidade de Ribeirão Preto); Carlos Alexandre Twardowschy, neurologista, Chefe da Residência em Neurologia e Professor da Faculdade de Medicina da PUCPR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná). Revisão Técnica: Fátima Dumas Cintra.
Referências: 2015 ESC Guidelines for the management of patients with ventricular arrhythmias and the prevention of sudden cardiac death. European Heart Journal; Antonio Bayés de Luna, Roberto Elosua et alli. Sudden Death. Revista Española de Cardiología. 2012; Gherardo Finocchiaro, Michael Papadakis, Jan-Lukas Robertus et alli. Etiology of Sudden Death in Sports - Insights From a United Kingdom Regional Registry. JAAC. 2016; Devinsky O, Hesdorffer DC, Thurman DJ, Lhatoo S, Richerson G. Sudden unexpected death in epilepsy: epidemiology, mechanisms, and prevention. Lancet Neurol. 2016.
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