Sem vacinas e maltratados: veja as doenças que você pode pegar do seu pet
Os primeiros lobos foram domesticados há milênios, e a arqueologia acredita que isso ocorreu entre 20 mil e até 500 mil anos. Desses animais, possivelmente contraímos pela primeira vez a raiva, causada pelo Lyssavirus. A doença, que tem por sintomas agressividade, espuma pela boca, agitação e faz até mesmo o infectado urrar, contribuiu para a lenda dos lobisomens.
Os lobos evoluíram e a raiva também, para infectar cães, humanos modernos, gatos, porcos, morcegos, macacos. Hoje, a doença que, em média, leva 45 dias para dar os primeiros sinais e a morte de 2 a 7 dias, está presente em todos os continentes e mata cerca de 60 mil pessoas ao ano. No Brasil, o Ministério da Saúde contabilizou 39 casos em humanos entre 2010 e 2021.
Mas há uma série de outras zoonoses e enfermidades transmitidas entre bichos e homens. Em se tratando de animais domésticos, o risco é maior nos não vacinados, doentes, com parasitas, mal alimentados, sem acompanhamento veterinário e de origem silvestre.
Só que a culpa não é deles, mas de quem não se informa, abandona, interage e cuida errado, maltrata, não respeita seu espaço, sua natureza e suas necessidades, trafica e não apoia projetos de causa animal.
Cães: micoses, vermes, doença de carrapato
Além da raiva, já citada (e transmitida pelo contato por saliva, mordida ou arranhão, mas prevenida com vacinas), cães sem atenção devida podem repassar aos humanos micoses, provocadas por fungos em pele ou pelo, causando vermelhidão, descamação e intensa coceira. Mas tanto para animal como homem há tratamentos dermatológicos.
Outras ameaças são as infecções por vermes e parasitas (equinococose, toxocaríase, larva migrans, giardíase) e que podem causar em humanos: febre, diarreia, anemia, tosse, dor no peito, urticária, enxaqueca, amarelecimento dos olhos (icterícia), pele "mapeada", cistos e inchaço de órgãos. Locais de defecação e públicos, como parques, praias e jardins oferecem perigo especial. Já os tratamentos variam de medicamentos, terapia a laser e até cirurgias.
Cães com carrapatos podem favorecer a doença de Lyme, que provoca manchas vermelhas, dores articulares e rigidez na nuca. Com leishmaniose (cujos danos são viscerais, cutâneos e de mucosas) e depois picados por mosquitos-palha, também a passam adiante. Até mesmo se tiverem contato com urina de ratos oferecem risco. Podemos pegar leptospirose, ficar mal e morrer. São doenças que precisam ser descobertas cedo e requerem terapias trabalhosas.
Agora, se sua dúvida é em relação à sarna do cachorro, saiba que dos três tipos principais, apenas a sarna sarcóptica (infelizmente a mais comum) pode ser transmitida para humanos. A doença se infesta pelo corpo e provoca sobretudo coceira, que piora à noite. Mas é curável.
Gatos: perigo das garras à caixa de areia
Em comum com os cães, felinos podem transmitir raiva, parasitas, micoses e outras doenças por saliva, urina, fezes ou arranhões. Bem conhecida, a doença da arranhadura de gato tem por trás bactérias Bartonella henselae, prevalentes em áreas com pulgas, e que no organismo humano desencadeiam infecção de pele, inchaço nos gânglios, febre, mal-estar, dor de cabeça. Crianças pequenas e pessoas imunodeprimidas são mais vulneráveis, mas há tratamento.
Outra bactéria, Pasteurella multocida (presente na boca de cães, mas principalmente em gatos) é ainda mais perigosa. Após a mordida, ela inocula na pele, que inflama, chega aos vasos linfáticos e pode atingir ossos e causar gangrena. Como a evolução do quadro é rápida (em questão de poucas horas os sinais são perceptíveis), é necessário ir ao pronto-socorro.
Gatos não mantidos dentro de casa ou criados por acumuladores de animais estão sujeitos ao fungo Sporothrix schenckii, causador da esporotricose, que em 2020 fez a SBMT (Sociedade Brasileira de Medicina Tropical) emitir um alerta de risco de surto no país. Negligenciada e um problema de saúde pública, a doença causa úlceras que se alastram e "consomem" o animal. Humanos e cães correm risco e, para evitar danos, antifúngicos precisam ser usados rapidamente.
Preocupação de gestantes, a toxoplasmose, que para o feto humano provoca diversos danos, desde inflamações na retina até deformações e aborto, é mais comum de ser transmitida por gatos que caçam nas ruas e se alimentam de carne crua contaminada. Mas a transmissão deles para nós é estimada em apenas 1% e o perigo maior está na caixa de areia, onde os ovos do parasita toxoplasma são expelidos com suas fezes. Por isso, limpe diariamente e prefira ração.
Já as crises alérgicas, com espirros e coceira no nariz, não são causadas propriamente pelos gatos. O sistema imunológico de algumas pessoas é que naturalmente reage com exagero ao contato com os agentes presentes no pelo deles. Mas ter um gato pode reduzir esse risco, como o de asma, principalmente se a presença dele for estabelecida desde a nossa infância.
Pássaros: diarreia, pneumonia e piolhos
Quem prefere pets voadores, como periquitos, cacatuas e papagaios também não está livre de adoecer. A zoonose mais comum é a psitacose, provocada pela bactéria Chlamydia psittaci, que em aves dá sonolência, diarreia, perdas de peso e apetite.
O contágio em humanos é pela inalação do pó das fezes presentes em poleiros sujos e penas e o resultado é: tosse, calafrios, febre, lesões, dor de cabeça e até morte de idosos. O tratamento é feito com antibióticos.
Pelos excrementos também podemos contrair bactérias do gênero Salmonella e Escherichia coli e desenvolver infecções gastrointestinais. Há também fungos, muitos presentes em cocô de pombo e pardal, que se inalados por nós repercutem em criptococose ou histoplasmose. Infecções com sintomas de pneumonia, mas a primeira também de meningite. Representam sério perigo para pessoas com HIV/Aids, transplantadas, e são combatidas com drogas fortes.
Podemos ainda pegar gripe aviária, causada pelo vírus da influenza tipo A e mais comum em galinhas do que em canários e periquitos, mas ainda possível, e alguns tipos de ácaros conhecidos por "piolhos". Eles mordem pessoas que manipulam pássaros vivos, em gaiolas ou seus ninhos, desencadeando na pele reações alérgicas muito incômodas, com vermelhidão, coceira, similares a picadas de insetos. O tratamento é feito com medicações anti-histamínicas.
Hamsters, peixes, furões, répteis...
Roedores como hamsters e ratinhos, se adquiridos de criadores irregulares, mantidos na sujeira ou com animais contaminados, podem transmitir Salmonella, leptospirose e, mais raramente, o vírus da coriomeningite linfocitária, semelhante a influenza ou meningite asséptica, com sintomas de febre, dores e fraqueza. Em porquinhos-da-índia, chinchilas e coelhos o risco é menor, mas existe. Sobre tratamentos, podem ser realizados em casa, mas também exigir internação.
Peixes ornamentais e mesmo os aquários também podem ser vetores de doenças. Sem proteção, colocar mãos e antebraços (ainda mais com cortes, arranhões, queimaduras) nesses animais e numa água podre e contaminada com fezes, restos de escamas, comida, plantas e até cadáveres, pode resultar em micoses e lesões de pele pela bactéria Mycobacterium marinum. Também são relatadas Salmonella e infecções gastrointestinais por outros agentes.
Curte pets mais "exóticos", como furões ou iguanas? Pois os primeiros podem nos infectar pelos vírus da hepatite E e raiva (há estudos se pelo novo coronavírus também, bem como nos seus parentes visons), além de bactérias contraídas por mordidas e arranhões e que podem evoluir para infecções sérias (cutâneas, respiratórias e glandulares). Iguanas, por sua vez, podem nos provocar salmonelose (gastroenterite grave), bem como as cobras e tartarugas.
Fontes: Nelson Douglas Ejzenbaum, pediatra e neonatologista, membro da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria); Júlio Pereira, médico pela UFBA (Universidade Federal da Bahia) e neurocirurgião; Gerson Oliveira, doutor em medicina tropical pela UnB (Universidade de Brasília) especializado em doenças infecciosas; Maria de Fatima Amorim, dermatologista na Afya Educacional; Pedro Horta, médico veterinário pela FMVZ-USP (Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo); Raymundo Paraná, professor de gastro-hepatologia da UFBA (Universidade Federal da Bahia); e Cícero Matsuyama, otorrinolaringologista do Hospital Cema, em São Paulo.
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